Se fizessem Lucy Makaza-Mazingi ministra na Espanha, na pior das hipóteses haveria um rebuliço. Tem apenas 35 anos e muitos sábios franziriam a testa por sua falta de experiência. Mas Lucy mora no Zimbábue e em Harare é quase uma idosa: tem toda a vida pela frente, mas já supera a expectativa de vida do país sul-africano. A reportagem é de Pere Rusiñol e está publicada no El País, 25-06-2008. A tradução é do Cepat.
Quando o Zimbábue se tornou independente do Reino Unido, em 1979, as pessoas tinham uma expectativa de vida próxima dos 60 anos. De lá para cá, se elevou em quase todo o mundo, salvo neste país, onde despencou depois de 28 anos de Governo de Robert Mugabe, o herói da independência convertida em pesadelo: a idade média hoje é de apenas 35 anos, a mais baixa do mundo segundo a ONU.
“Me sinto muito jovem, mas aqui é tudo diferente. Posso estar contente porque superei a média”, explica Lucy Makaza-Mazingi, sempre otimista. O colapso da economia – 80% de desemprego e 160.000% de inflação, uma cifra que alguns cálculos independentes elevam para 1.000.000% - cobrou como primeira vítima o sistema de saúde. Antes, os hospitais de Zimbábue eram uma referência para toda a África. Agora, não existem.
“Os protocolos continuam sendo muito bons e o sistema foi bem pensado; o problema é que não existe dinheiro para mantê-lo”, explica Manuel López, responsável pela ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Zimbábue. Todas as ONGs foram postas em quarentena pelo Governo de Robert Mugabe, que as considera aliadas do “imperialismo”, mas MSF mantém abertos os seus escritórios num país em bancarrota.
Os hospitais de Harare parecem normais por fora. O problema está dentro: a maioria dos médicos – algumas estimativas independentes consideram que mais de 50% - fugiu nos últimos anos. A hiperinflação faz com que em apenas dois meses se gaste o orçamento de todo o ano, razão pela qual os que ficam devem trabalhar praticamente de graça – com bons salários no papel, mas irrisórios na prática – e sem meios: com apagões contínuos de luz e sem medicamentos.
“Torna-se cada vez mais difícil de lutar. Antes havia tratamento gratuito. Agora devo pagar para receber a maioria dos remédios e não tenho dinheiro. Vou ao hospital e me dizem que não me podem dar os medicamentos que necessito e que tenho que consegui-los por conta própria”, explica Tariro Cihkwantha, de 47 anos, soropositiva desde 1997. O pouco que ganha como subsídio do Estado não serve para nada porque a hiperinflação come tudo.
A aids está descontrolada no Zimbábue e é a principal causa da queda abrupta da expectativa de vida. Agora o regime tira proveito porque no papel está se reduzindo sua incidência, que na teoria afeta 20% da população.
Mas as ONGs que trabalham com a doença – no Zimbábue, trata-se de uma epidemia fora de controle – temem que o descenso tenha outra causa, muito mais brutal: a mortandade é tão elevada que necessariamente deve reduzir a porcentagem de pessoas afetadas. As ONGs que trabalham em campo calculam que cerca de 3.000 pessoas morrem a cada semana em conseqüência da aids. No silêncio.
As eleições pioraram ainda mais a situação, já muito dramática. No começo do mês, o Governo de Mugabe limitou muito o trabalho das ONGs: considerou-as aliadas do imperialismo.
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