Conspiração do sigilo
Impunidade fortalece movimento visando a impedir o fim das votações secretas no Poder Legislativo
NÃO CAUSOU surpresa a absolvição dos senadores Ney Suassuna (PMDB-PB), Serys Slhessarenko (PT-MT) e Magno Malta (PL-ES) ontem pelo Conselho de Ética. Somada às evidências nem sempre conclusivas, a falta de mobilização contra o escândalo dos sanguessugas no período pós-eleitoral deu origem a mais um desfecho morno e conciliador.
A consumação da previsível ausência de sanções contra os acusados, porém, não pode dar força à sub-reptícia manobra, em curso na política federal, destinada a abater as raras promessas de ganhos institucionais que vieram na esteira dos casos dos sanguessugas e dos mensaleiros. Não pode contribuir para que se apague da agenda dos legisladores a necessidade de dar cabo do voto secreto no Parlamento.
O dispositivo é um dos vértices da impunidade no Congresso. Parte considerável da leniência no julgamento político dos envolvidos nos escândalos recentes se deve à norma que determina o sigilo nas votações. A fração irrisória de deputados punidos após o mensalão (apenas três, entre 19 acusados), benevolência que deve repetir-se no caso dos sanguessugas (que se contam às dezenas), pode em boa parte ser atribuída à desobrigação dos parlamentares em revelar o voto.
A Câmara aprovou em primeiro turno, no início de setembro, a proposta de emenda constitucional que acaba com o voto secreto em plenário. Mas é preciso ainda um segundo turno na Casa e mais dois escrutínios no Senado, todos por maioria qualificada de três quintos. Não faltam interessados em impedir sua aprovação.
Há entre os senadores uma campanha em curso para manter o sigilo em votações consideradas polêmicas, como a eleição para as Mesas diretoras e a derrubada de vetos presidenciais. Os defensores dessas medidas atenuantes argumentam que, do contrário, o Executivo teria um mapa para retaliações contra parlamentares que contrariassem o Planalto. Os presidentes eleitos das Casas poderiam hostilizar os que não apoiassem sua candidatura.
O temor de retaliação deve ser combatido -mas com publicidade. Perseguições e discriminações podem com facilidade ser detectadas e denunciadas. E elas significam pouco perto de uma constatação óbvia: na condição de representantes de milhões de eleitores, os parlamentares têm de prestar contas de seus atos. Não há como fazê-lo se um conjunto fundamental de suas manifestações estiver sob sigilo.
A experiência recente, ademais, deu reiteradas mostras de que o segredo do voto tem servido como veículo para o "direito de trair". Deputados federais e senadores valem-se do recurso para agir em desacordo com seu bloco parlamentar, seja ele governista ou opositor, sem arriscar-se a ser punidos pelo ato.
Os desmandos em série dos últimos meses deixaram claro que a política brasileira precisa avançar muito na agenda da transparência e da coerência partidária. O fim do voto secreto no Legislativo seria um marco histórico nessa caminhada republicana.
Impunidade fortalece movimento visando a impedir o fim das votações secretas no Poder Legislativo
NÃO CAUSOU surpresa a absolvição dos senadores Ney Suassuna (PMDB-PB), Serys Slhessarenko (PT-MT) e Magno Malta (PL-ES) ontem pelo Conselho de Ética. Somada às evidências nem sempre conclusivas, a falta de mobilização contra o escândalo dos sanguessugas no período pós-eleitoral deu origem a mais um desfecho morno e conciliador.
A consumação da previsível ausência de sanções contra os acusados, porém, não pode dar força à sub-reptícia manobra, em curso na política federal, destinada a abater as raras promessas de ganhos institucionais que vieram na esteira dos casos dos sanguessugas e dos mensaleiros. Não pode contribuir para que se apague da agenda dos legisladores a necessidade de dar cabo do voto secreto no Parlamento.
O dispositivo é um dos vértices da impunidade no Congresso. Parte considerável da leniência no julgamento político dos envolvidos nos escândalos recentes se deve à norma que determina o sigilo nas votações. A fração irrisória de deputados punidos após o mensalão (apenas três, entre 19 acusados), benevolência que deve repetir-se no caso dos sanguessugas (que se contam às dezenas), pode em boa parte ser atribuída à desobrigação dos parlamentares em revelar o voto.
A Câmara aprovou em primeiro turno, no início de setembro, a proposta de emenda constitucional que acaba com o voto secreto em plenário. Mas é preciso ainda um segundo turno na Casa e mais dois escrutínios no Senado, todos por maioria qualificada de três quintos. Não faltam interessados em impedir sua aprovação.
Há entre os senadores uma campanha em curso para manter o sigilo em votações consideradas polêmicas, como a eleição para as Mesas diretoras e a derrubada de vetos presidenciais. Os defensores dessas medidas atenuantes argumentam que, do contrário, o Executivo teria um mapa para retaliações contra parlamentares que contrariassem o Planalto. Os presidentes eleitos das Casas poderiam hostilizar os que não apoiassem sua candidatura.
O temor de retaliação deve ser combatido -mas com publicidade. Perseguições e discriminações podem com facilidade ser detectadas e denunciadas. E elas significam pouco perto de uma constatação óbvia: na condição de representantes de milhões de eleitores, os parlamentares têm de prestar contas de seus atos. Não há como fazê-lo se um conjunto fundamental de suas manifestações estiver sob sigilo.
A experiência recente, ademais, deu reiteradas mostras de que o segredo do voto tem servido como veículo para o "direito de trair". Deputados federais e senadores valem-se do recurso para agir em desacordo com seu bloco parlamentar, seja ele governista ou opositor, sem arriscar-se a ser punidos pelo ato.
Os desmandos em série dos últimos meses deixaram claro que a política brasileira precisa avançar muito na agenda da transparência e da coerência partidária. O fim do voto secreto no Legislativo seria um marco histórico nessa caminhada republicana.
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