"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, abril 28, 2009

E o relatório sobre a escuta?

Blog do Luis Nassif - 27/04/09

De O Globo

De 18.12.2008

Três meses depois, nada se sabe sobre grampo
PF deve encerrar em janeiro investigações sobre escuta no STF, que até hoje não têm provas nem suspeitos

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. Os delegados da Polícia Federal Rômulo Berredo e William Morad deverão encerrar em janeiro as investigações sobre o suposto grampo em telefones do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Até o momento, depois de analisar os depoimentos de mais de 120 pessoas ao longo de três meses de investigação, os dois delegados não têm qualquer indício de autoria ou mesmo da existência do grampo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva espera o resultado do inquérito para decidir se reconduz o delegado Paulo Lacerda ao comando da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Comentário

A Polícia Federal não encerra nunca esse inquérito porque, completado, desmascará a armação preparada pela presidência do STF com a revista Veja, em torno da tal “escuta ambiental” que nunca aconteceu.

Se isso não for quebra de decoro, o que seria? O presidente do STF pode participar de armações, fazer prejulgamentos, atacar categorias inteiras - de juízes de primeira instância, procuradores, policiais federais, pode manter uma empresa que se beneficia indiretamente do poder de seu sócio. Como fica?

Por Marco Antonio

A questão nem é essa. Como é que se instaura um inquérito sem qualquer indício de materialidade? Pior, havia desde o início indícios de fraude ( ou afirmação difamatória, já que foi feita a imputação do fato à Abin, textualmente). Afinal de contas, não foi apresentado qualquer áudio à Polícia Federal, embora a revista Veja tenha afirmado ter a gravação. A publicação não podia agasalhar-se sob o manto do sigilo de fonte, em virtude de a apresentação de uma conversa gravada_ e inclusive publicada_ não possibilitar a identificação de fonte alguma. E esse único e simples fato, que é o não surgimento do áudio, permite duas conclusões:

1- A Revista não possui o áudio. Como afirmou que obteve a conversa através de gravação, não por outro meio, e não apresentou provas, a suposição que se deve fazer é a de que a denúncia é falsa. E a confirmação da conversa_ de teor oportunamente desprovido de interesse público_ pelos agentes públicos em questão não serve como corroboração da denúncia. Ambos são suspeitos. O Ministro, por estar declaradamente em guerra contra as investigações policiais ( tanto que rapidamente atribuiu o ” grampo” à Abin). O Senador, um dos mais ferrenhos oposicionistas, e que a todo momento declara seu apoio ao Ministro. A apresentação do áudio era de interesse dos denunciantes, não de quem supostamente tivesse feito a gravação. Logo, a incoerência dos fatos permite a conclusão de que não houve escuta ilegal.

2- Dada a falta de evidência da prática de crime denunciado, com obstaculização da própria denunciante primária, a autoridade policial, devia trabalhar em outras direções, como a possibilidade de motivação política ter gerado a acusação. É o procedimento em todas as investigações. Se alguém denuncia que foi sequestrado, e a polícia não encontra indícios de tal procedimento, começa a trabalhar com outras hipóteses, como desaparecimento, crime forjado, tudo dependendo das circunstâncias. Estranhamente, neste caso não o fez. Pelo contrário, mesmo diante de várias provas de que não houve escutas ilegais ou gravações ambientais no Supremo Tribunal Federal, manteve um inquérito parado, sem providências nem arquivamento. Vislumbra-se aqui uma prática incompatível com as atribuições da PF. Afinal, ou há uma negligência policial ou uma motivação política, como, por exemplo, o enfraquecimento da ABIN visando a levar eventuais intérpretes judiciais a considerar a participação da agência em operações policiais presumivelmente ilegais, com tal precedente.

São as conclusões possíveis. De tudo, porém, resta uma certeza. Não há opositores políticos nessa história. O que, de certa forma, a elucida.

Por João Vergílio

Essa onda recente de denúncias contra parlamentares pode não ter sido explicitamente montada para remendar a credibilidade dos grandes órgãos de imprensa, mas é exatamente esse o papel que ela cumpre. Vale aqui, no nível das reações grupais, o que vale em ponto menor na vida de cada um de nós. Guiamo-nos por uma espécie de instinto, que nos diz o que fazer em situações de perigo antes mesmo que possamos tomar plena consciência dos passos que fomos dando para nos proteger. Ao encher as primeiras páginas com manchetes bombásticas a respeito de pequenas e médias transgressões de nossos parlamentares, tanto os jornalões quanto a revistona colocam-se no papel de zeladores da ética e dos bons costumes. Ao mesmo tempo, fabricam um “outro” encarregado de defini-los (mentirosamente, é claro) por antonomásia.

Chamando esse Outro de ladrão, colocam-se no lugar dos santos guerreiros impolutos que, movidos pelo mais puro idealismo, resolveram arremeter em bloco contra o dragão da maldade. Isso depois de terem protagonizado um dos mais descarados esquemas de acobertamento já postos em funcionamento no Brasil até hoje.

Era uma providência que, se não foi planejada, como creio que não foi, mesmo, era absolutamente necessária. Todas as mentiras contadas ao longo destes últimos meses, todas as omissões e distorções acumuladas nas páginas de nossos principais órgãos de imprensa estão por um fio. A CPI não indiciou ninguém, mas ainda foi possível recorrer à velha e surrada imagem das pizzas para insinuar uma conivênica acobertadora; a sentença dizendo com todas as letras que a colaboração com a Abin fora absolutamente normal pôde passar batida graças ao tom abstruso dos vereditos, incapaz de chamar a atenção dos leitores; inquéritos da própria PF, mesmo conduzidos com uma truculência absolutamente invulgar, envolvendo buscar e apreensões de computadores pertencentes ao filho e à esposa de Protógenes, puderam deslisar para fora do campo de atenção do respeitável público maculados, talvez, pela suspeita de que, no final, tenha vencido um certo “espírito de corpo”. Sequencialmente, cada um desses revezes podia ser absorvido.

Estava cada vez mais difícil, porém, lidar com o efeito do conjunto deles. O discurso da revista Veja ia ficando insustentável até mesmo aos olhos daqueles que se mostraram mais simpáticos, num primeiro momento, à tese gilbertina da República dos Grampos.

Some-se a isto as inevitáveis fraturas na patota, à medida que os assuntos se diversificaram, e os interesses também, e ter-se-á uma daquelas situações de risco iminente a que me referi acima - aquelas em que reagimos sem pensar muito, guiados por uma espécie de sexto sentido para uma posição segura.

Foi quando, trazidas pelas asas de um anjo, surgiram as benditas passagens aéreas. Nada poderia responder com mais exatidão às necessidades do momento. Um gasto legal, mas alegadamente imoral. Eureka! É disto exatamente que precisavam aqueles que foram se apegar aos últimos fiapos da lei para, após um processo tão rigoroso quanto descarado de filtragem e deformação, trombetearem aos quatro ventos que, por mais que o interesse nacional berrasse alto em favor do pobre delegado, não, não pode ser, não, nunca, jamais, de jeito nenhum - dura lex sed lex, no cabelo, só Gumex.

Agora, é esperar. Os grandes lances estão todos nos pés do presidente Lula. Meu palpite é que ele não irá chutar bola nenhuma. Manterá uma distância dos assuntos mais espinhosos que seja suficiente para que seus operadores negociem apoios de todo tipo para as eleições que se avizinham. O exílio de Paulo Lacerda será mantido, e as conversações de José Dirceu também. Talvez tenha que suportar uma ou duas semanas de encheção de saco por conta de algum escandalozinho que repingue no Palácio, mas isso é da vida. Está lá para isso mesmo. O jogo é esse. Faz parte, como dizia o Bambã.

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