Milhares de camponeses a pé, em tratores, em caminhões e com reboques que carregavam vacas e cavalos tomaram, no dia 31 de janeiro, o centro da capital do México, numa mobilização multitudinária para protestar contra o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) assinado por México, Estados Unidos e Canadá, e contra o fim da proteção tarifária aos produtos do setor agropecuário desde 1º de janeiro passado. As informações são do El País, 01-02-2008, e foram traduzidas pelo Cepat.
Os manifestantes confluíram à capital mexicana procedentes de diversos Estados, convocados por sindicatos e organizações agrárias sob a consigna “Sem milho não há país”.
Os manifestantes exigem a renegociação do capítulo agrícola do Nafta. O tratado foi assinado em dezembro de 1992 e entrou em vigor de maneira progressiva em janeiro de 1994. A entrada sem taxas de importação de produtos provenientes dos Estados Unidos, como arroz, milho, aveia, gengibre, açafrão e trigo, e a importação de carne, provocaram o protesto dos produtores mexicanos, que reclamam salvaguardas comerciais.
A entrada no México a tarifa zero de grandes quantidades de milho, produto básico na dieta dos setores populares, representa um duro golpe para o setor agrário. Diante dos riscos que o Nafta entranhava para o México no capítulo agrário, o Governo federal prometeu medidas de apoio ao campo e reiterou os grandes benefícios acarretados pelo Nafta com os Estados Unidos. Mas as promessas não se cumpriram.
Os alimentos são cada dia mais caros, a produção é insuficiente e o abastecimento dos setores mais pobres está em risco diante da volatilidade dos mercados internacionais. O campo mexicano vive uma situação de abandono e seus habitantes não têm opção melhor que a emigração ilegal para o país vizinho do Norte. Este círculo vicioso despovoou extensas regiões do país.
Esta gigantesca manifestação só surpreendeu o governo - adianta reportagem do jornal argentino Página/12, 01-02-2008 -, que sistematicamente se negou a renegociar o capítulo do Nafta que, a partir de 1º de janeiro deste ano, eliminou totalmente as barreiras tarifárias para as importações de milho, feijão, leite e açúcar. Afinal de contas, os Estados Unidos e o Canadá não estão dispostos a fazê-lo, argumenta o governo mexicano.
O certo é que quatro governos consecutivos desperdiçaram 14 anos para fazer algo que garantisse a competitividade dos produtores mexicanos e os protegesse das práticas desleais norte-americanas. Em vez disso, terminaram por desmantelar o pouco de rentabilidade que restava ao campo. Sete anos dos últimos dois governos priistas, sete dos primeiros dois governos panistas. Responsabilidade plenamente compartilhada. Não há o que fazer e o sabem. Por isso, a administração de Felipe Calderón optou pela retórica e sua reação se limitou a vangloriar-se das vantagens do Nafta que, segundo ele, significou maiores exportações agrícolas, “cinco vezes mais que em 1994”, segundo Calderón.
Mas a realidade desmente a todos: entre 1995 e 2007, a superfície semeada no país acarretou uma diminuição de 12,6%; a superfície colhida caiu 10%; o rendimento por hectare aumentou 28%; a produção dos principais cultivos de grãos e oleaginosas cresceu 25,3% e a importação, 114%, enquanto que a exportação diminuiu 31%. Em 1995, 87,3% do consumo aparente de milho no México foi coberto com produção nacional; em 2007, essa proporção caiu para 75%. Nos demais grãos é igual ou pior no mesmo período: aumento de 238% na importação de feijão, 120% de arroz, 217% de trigo, e assim por diante com a soja, sorgo, cevada e semente de algodão.
Os Estados Unidos noticiaram que durante o último ano fiscal (outubro de 2006 a setembro de 2007), o México importou deste país 1886 milhões de dólares de grãos forrageiros (fundamentalmente milho e um pouco de sorgo), o que representou 65% a mais que no ano anterior e 93% acima de 2003. Em 2006, 10,7 milhões de toneladas importadas dos Estados Unidos cobriram 33% do consumo nacional.
E agora que não há barreiras, nos Estados Unidos não desaparecem as barreiras não tarifárias e medidas antidumping, além dos fortes subsídios já existentes para seus produtores e um elaborado sistema de apoios financeiros da banca comercial para a exportação. Diante disso, o governo de Calderón balbucia e o secretário da Agricultura – cuja renúncia também é exigida pelos partidos políticos de oposição – apenas promete alguns subsídios para alimentos de animais e ajuda para alguns produtores, porque, segundo ele, os efeitos negativos do Nafta sobre o milho e o trigo serão compensados pelos preços maiores no mercado internacional diante da maior demanda norte-americana por etanol.
Segundo os manifestantes, o Nafta foi responsável pela emigração para os Estados Unidos de pelo menos cinco milhões de mexicanos e por altíssimos níveis de pobreza para 75% da população.
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