Os cientistas estão implicados numa contradição: "eles produzem conhecimentos que eles querem que estejam acessíveis a todos, mas esses mesmos conhecimentos estão no centro da riqueza e da economia, portanto, são fontes de novas desigualdades", afirma o sociólogo Dominique Wolton em entrevista ao Le Monde, 29-01-2007. Wolton é o diretor do Instituto das Ciências da Comunicação no Centro Nacional de Pesquisa da França (CNRS); é especialista em comunicação política e dos meios de comunicação e fundador e diretor da revista científica Hermès. Escreveu, entre outros, os livros Internet, e depois? Uma teoria crítica das novas mídias. Porto Alegre: Sulina, 2003, e Elogio do grande público. São Paulo: Ática, 1996, entre outros livros.
O que tem a dizer entre si um físico, um biólogo, um químico e um ambientalista?
Dominique Wolton - Todas as ciências desenvolvem uma teoria da informação e da comunicação. Na biologia, trata-se da comunicação celular. Na física, das interações entre partículas elementares e átomos. Na química, de reações entre compostos. Na astronomia, da atração entre corpos celestes e galáxias. No meio ambiente, da interdependência entre espécies e meios. Na sociologia, de relações entre indivíduos e grupos sociais... A riqueza do CNRS é que todas as disciplinas são apresentadas. Pode-se, portanto, comparar essas diferentes teorias. É um trabalho de epistemologia.
Você também quer dizer que toda produção de conhecimento, toda descoberta - a relatividade de Einstein como a mecânica quântica - procede de um modelo cognitivo, até mesmo ideológico?
Dominique Wolton - Sim. Só se pode descobrir aquilo de que se está perto de conceber. O modelo geocêntrico do sistema solar proposto por Ptolomeu está ligado a uma representação. Foi preciso esperar pelo Renascimento para que Copérnico pudesse substituir o modelo heliocêntrico. Da mesma maneira, a biologia foi transformada pelo modelo cibernético, e as ciências humanas pela teoria dos sistemas. Para além das concepções, existem modelos cognitivos que se impõem à atividade científica e que misturam racionalidade e imaginário.
Os cientistas devem informar ou comunicar?
Dominique Wolton - Atualmente, informar não basta para comunicar. Vimos isso com a polêmica sobre as performances da pesquisa francesa (Le Monde de 16 e 23 de janeiro): os cientistas devem também se preocupar com a maneira como a sua atividade é percebida.
Os pesquisadores estão presos a duas exigências: de um lado, repensar sua relação com a sociedade, integrando a demanda social, mas também o impacto social de seus trabalhos; de outro, lutar para conservar sua autonomia e não se deixar instrumentalizar pela sociedade.
Outra contradição: eles produzem conhecimentos que eles querem que estejam acessíveis a todos, mas esses mesmos conhecimentos estão no centro da riqueza e da economia, portanto, são fontes de novas desigualdades. Isso coloca o problema do acesso aos recursos, da proteção dos dados, das indústrias do conhecimento... Questões eminentemente políticas.
Já existe no CNRS um departamento de ciências e tecnologias da informação. Em que você se inspira naquele?
Dominique Wolton - A grande ilusão é reduzir a comunicação à sua dimensão técnica. Acreditamos que a Internet, os computadores portáteis, as redes, e, antes, a televisão e o rádio, significavam o surgimento da aldeia global, em oposição à torre de Babel onde os homens são separados pelas barreiras lingüísticas. A realidade é bem outra. Quanto mais a comunicação é instantânea, mais se manifesta a falta de comunicação. O fim das distâncias físicas não aproxima os homens, mas revela a amplitude das diferenças culturais. Ela faz aparecer, mais do que nunca, que o Outro é diferente de Mim.
Na realidade, há duas filosofias da comunicação. Aquela que privilegia a técnica, e conseqüentemente a economia. Aquela que privilegia o homem, e conseqüentemente a política. Colocam-se as seguintes opções: ou se matam mutuamente ou coabitam. É por essa razão que a comunicação está sempre do lado da democracia.
Você gostaria de se apoiar sobre as comunidades lingüísticas. Por que?
Dominique Wolton - As áreas lingüísticas são amortecedores da violência mundial. Quando se fala a mesma língua, ultrapassa-se mais facilmente os conflitos culturais, religiosos, societais... para aprender a viver juntos. Comunicar é menos partilhar que respeitar as diferenças.
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