"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, agosto 05, 2008

O desafio chinês

Blog do Luis Nassif - 03/08/08

No Estadão, artigo de John Pomfret, do Washigton Post, com uma visão pessimista sobre a China (clique aqui). É um bom apanhado dos grandes problemas chineses, mas acredito que falte a ele uma noção mais clara dos estudos sobre desenvolvimento, produzidos especialmente após o pioneiro Michel Porter.

O fato de grande parte da produção mais sofisticada da China ser de empresas não-chinesas mostra apenas um estágio do desenvolvimento chinês. É evidente que essas empresas estão trazendo capacitação, visão de mundo, adensamento da cadeia produtiva, desenvolvimento de fornecedores.

Em todo caso, o artigo vale pelo retrato atual da China e pelos desafios que terá que enfrentar:

(...) Há muitas limitações inseridas nos sistemas social, econômico e político do país. Por causa de quatro principais motivos - uma demografia falida, uma economia superestimada, um meio ambiente sob ataque e uma ideologia que encontra dificuldades para ser exportada - é mais provável que a China permaneça como o adolescente musculoso do sistema internacional, em vez de se tornar a mestra do mundo.

Demografia

Mas a demografia chinesa vai mal. Nenhum país está envelhecendo tão rápido quanto a República Popular, que está a caminho de se tornar o primeiro país do mundo a envelhecer antes de enriquecer. Por causa da famosa política de filho único do Partido Comunista, o número médio de filhos nascidos para as mulheres chinesas caiu de 5,8, na década de 70 para 1,8 atualmente - abaixo da taxa de 2,1 necessária para manter a população estável.

Enquanto isso, a expectativa de vida subiu bastante, de apenas 35 anos em 1949 para mais de 73 anos hoje. Os economistas preocupam-se com a redução da população chinesa em idade economicamente ativa, que aumentará os custos do trabalho, erodindo significativamente uma das principais vantagens competitivas da China.

Ainda pior, os demógrafos chineses, como Li Jianmin da Universidade Nankai, agora prevêem uma crise envolvendo os idosos da China, um grupo que vai inchar, passando de 100 milhões acima dos 60 anos de idade hoje para 334 milhões até 2050, incluindo impressionantes 100 milhões de pessoas acima dos 80 anos de idade.

Como a China fará para cuidar destas pessoas? Por meio de pensões? Menos de 30% dos habitantes urbanos as têm, e nenhum dos 700 milhões de agricultores dispõe delas. E o sistema chinês de pensões financiadas pelo Estado faz o sistema de bem-estar social americano parecer o Fort Knox. Nicholas Eberstadt, demógrafo e economista do Instituto American Enterprise, chama a bomba-relógio da demografia chinesa de "construção de uma tragédia humana em câmera lenta".

A renda per capita

Um nuance importante que insistimos em esquecer é o tamanho da população chinesa: cerca de 1,3 bilhão de pessoas, mais de quatro vezes a população americana. A China "deveria" ter uma grande economia. Mas em termos per capita, o país não é um dragão - é um lagarto de tamanho médio, instalado no 109º lugar do índice econômico mundial elaborado pelo Fundo Monetário Internacional, entre a Suazilândia e o Marrocos. A economia chinesa é grande, mas o seu padrão médio de qualidade de vida é baixo, e permanecerá assim por muito tempo.

O grande número utilizado como prova de que a China está devorando nosso almoço econômico é o déficit comercial americano em relação ao país, que no ano passado chegou aos US$ 256 bilhões de dólares. Mas quase 60% do total de exportações chinesas são realizadas por empresas pertencentes a não chineses. Em se tratando de exportações de alta tecnologia, como computadores e artigos eletrônicos, 89% delas são de empresas pertencentes a não chineses. A China faz parte do sistema global, mas ainda ocupa a posição de fábrica e linha de montagem de baixo custo - e são firmas estrangeiras, não chinesas, que estão recolhendo o grosso dos lucros.

Poluição

(...) Este ano, o país vai superar os EUA como maior emissor de gases associados ao efeito estufa. A China é a maior destruidora da camada de ozônio e a maior poluente do Oceano Pacífico. Das 20 cidades mais poluídas do mundo, 16 estão na China; 70% de seus lagos e rios estão poluídos e metade de sua população não dispõe de água potável limpa. Até 2030, o país enfrentará uma escassez de água equivalente à quantidade do líquido que é consumida hoje; as fábricas do noroeste já foram obrigadas a fechar porque simplesmente não há mais água. Até os economistas do governo chinês estimam que problemas ambientais consumam anualmente 10% do PIB nacional.

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