Praticamente invisível na América Latina uma década atrás, a China hoje está fabricando carros no Uruguai, doando um estádio de futebol para a Costa Rica e emprestando US$ 10 bilhões à maior empresa brasileira de petróleo. O país superou os Estados Unidos e se tornou o maior parceiro comercial do Brasil, a economia mais volumosa da América do Sul. A China avançou com agressividade para preencher um vácuo deixado pelos EUA nos últimos anos conforme americanos se concentravam nas guerras do Afeganistão e Iraque, ao que se somou a crise econômica.
A reportagem é de Tyler Bridges e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 15-07-2009.
"A China está em ascensão na América Latina, enquanto os EUA estão em declínio", disse Riordan Roett, professor de relações internacionais da Universidade Johns Hopkins, em entrevista por telefone durante sua estadia em São Paulo. "A China se faz sentir em toda a região. Estão seguindo uma política governamental de expansão da sua presença pacífica."
A China está incrementando suas embaixadas em toda a América Latina, abrindo centros de confucionismo para expandir sua cultura, enviando delegações comerciais altamente graduadas para toda a região e abrindo as portas para que os chineses comuns visitem Machu Picchu, o Rio, e outros destinos turísticos.
Aiping Yuan veio de Pequim para o Rio em 1997 em busca de diversão, mas se apaixonou pela cidade e decidiu ficar. Estudou português e, quando o presidente Luiz Inácio Lula da SilvaPetrobrás e da Vale. Ambas as empresas mantêm relações comerciais cada vez mais intensas com a China. "O chinês é o idioma do futuro para o Brasil." fez sua primeira visita à China em 2004, abriu uma pequena escola para ensinar mandarim. Ela começou com 6 alunos e hoje tem mais de 300, entre eles, executivos da
A China estabeleceu uma aliança estratégica com o Brasil que permitiu aos dois países firmar uma parceria com Índia e Rússia no chamado Brics, que exige um maior peso nas questões políticas e econômicas globais. De fato, China tem avançado nas suas relações com países em desenvolvimento de todo o mundo. O principal interesse de Pequim na América Latina foi garantir seu acesso às matérias-primas - especialmente o petróleo, minério de ferro, soja e cobre - para abastecer o seu acelerado crescimento contínuo. Para muitos países, há um aspecto negativo no comércio com a China, por meio do qual as importações baratas substituem produtos locais.
O papel cada vez maior desempenhado pela China alarmou o governo americano. Mas a China tem sido cautelosa em não estabelecer uma presença militar na região, que levaria a um antagonismo com Washington. Os EUA consideram a América Latina como parte da sua esfera de influência desde a Doutrina Monroe, de 1823.
A China "trata Hugo Chávez da mesma maneira que trata Álvaro Uribe e Lula", disse Alexandre Barbosa, consultor da firma Prospectiva, com sede em São Paulo, referindo-se aos presidentes da Venezuela, Colômbia e Brasil. "O interesse dos chineses está nos negócios." E como é voraz esse interesse. O comércio entre América Latina e China saltou de US$ 10 bilhões em 2000 para US$ 140 bilhões em 2008. A China compra zinco do Peru, cobre do Chile e minério de ferro do Brasil. O país exporta equipamentos eletrônicos para o Brasil, ônibus para Cuba, roupas para o México e carros para o Peru.
O presidente do Peru, Alan Garcia, tenta posicionar seu país enquanto grande centro comercial para a China na América do Sul. Ele espera se valer não apenas dos portos peruanos, localizados no centro do continente, como também da história que os dois países têm em comum: milhares de chineses imigraram para o Peru no século XIXe início do século XX para trabalhar nos serviços manuais. Esses imigrantes deixaram como legado os chamados restaurantes "chifa", que oferecem comida chinesa por todo o Peru. Hoje, a China demonstra grande apetite pelos abundantes minerais peruanos.
Duas empresas chinesas estão desenvolvendo grandes projetos de mineração no Peru enquanto empresas de outros países estão suspendendo ou cancelando obras, disse John Youle, presidente executivo da ConsultAndes, de Lima.
Entretanto, a China tem investido em geral pouco dinheiro na América Latina. Isso suscitou críticas de que o país estaria apenas se aproveitando dos fartos recursos minerais da região. Apesar de a China ter se tornado uma participante importante ao longo da última década, o volume do comércio ainda é pequeno se comparado ao estabelecido entre EUA e América Latina.
Além do comércio, a China está rivalizando com o Banco Mundial e o Banco de Desenvolvimento Interamericano enquanto grande credora da América Latina, numa época em que a China dispõe de muito dinheiro e grande número de empresas não consegue acesso aos empréstimos.
A Petrobrás está tomando um empréstimo de US$ 10 bilhões, que será pago com a exportação de 150 mil barris de petróleo por dia este ano e 200 mil barris por dia nos próximos 9 anos. O Equador está emprestando US$ 1 bilhão da China para financiar investimentos na sua estatal de petróleo e mais US$ 1,7 bilhão para construir a maior represa e usina hidrelétrica do país. A Venezuela está comprando da China plataformas perfuradoras de alta tecnologia para a extração de petróleo e enviando ao país cerca de 380 mil barris por dia enquanto Chávez diversifica a exportação, hoje centrada nos EUA.
Mas nem todos na América Latina dão as boas vindas aos chineses. Empresas chinesas estão atraindo os fregueses de empresas mexicanas que exportavam roupas para os EUA. Os peruanos tentaram bloquear a expansão de um projeto chinês de mineração perto da fronteira com o Equador. A China enfureceu empresas brasileiras ao substituí-las enquanto maior exportadora de têxteis e roupas para a Argentina.
Mas seja como parceira amigável ou concorrente implacável, a expansão contínua da China na América Latina parece inevitável.
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