Jacques Ellul era de baixa estatura, tinha a cabeça redonda e olhos maliciosos. Conhecia bem o pensamento de Marx, mas era anticomunista, declarava-se "antissartriano" e não escondia a sua fé protestante. Irritava os ambientes institucionais definindo-se anárquico, mesmo se, na realidade, foi mais simplesmente um não violento, um ecologista que busca "proteger" as costas da Aquitânia do turismo.
O comentário é do editorialista Corriere della Sera, Armando Torno, 10-07-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Deixou Paris para se retirar e ensinar em Bordeaux, onde as suas lições eram frequentadas por muitíssimos estrangeiros. Morreu em 1994. Jean-Luc Porquet, aluno e autor do livro "Jacques Ellul, l'uomo che aveva previsto (quasi) tutto" [J.E., o homem que tinha previsto (quase) tudo, em tradução livre], lembra que "estudantes norte-americanos chegavam da Califórnia ou do Colorado para acompanhar seus cursos". "Os seus arquivos – prossegue – estão conservados no Illinois. Hoje, a melhor especialista da bibliografia de Ellul é uma professora norte-americana, Joyce Main Hanks: recolheu cada palavra escrita no mundo sobre ele".
Mas quem era esse estudioso que Ivan Illich considerava uma das cinco pessoas mais importantes da sua formação e que, entre tantos, é venerado por Willem H. Banderburg, diretor do Centro para o Desenvolvimento Social e Tecnológico em Toronto? Entre ensinamentos e pesquisas, foi também autor de "Storia delle Istituzioni" [História das Instituições], que continua sendo um texto de referência: foi adotado por Gianfranco Miglio, que notava que os "subornos" ou a "propina", como quisermos, eram, para Ellul, inerentes ao sistema da Europa democrática, previsões, apenas com algumas décadas de antecipação, sobre os escândalos.
Depois, aprofundou o impacto da técnica sobre a sociedade contemporânea. E dessa análise, resta um dos fenômenos, distante – destaca Porquet – "dos bate-bocas verbosos da 'intelligentzia'Heidegger.
Agora, é publicado, de Ellul, "Il sistema tecnico", a obra de 1977 que compendia as suas concepções. O livro, mesmo que tenha algumas páginas datadas, polêmicas hoje não muito compreensíveis (por exemplo, a com Jacques Monod) e pequenas ingenuidades, continua atualíssimo.
Se, em "Propagandes" (1962) ele "demonstra – nota Porquet – que as democracias modernas usam e abusam da propaganda, que, em retorno, ameaça seus fundamentos", com o livro que é publicado agora em italiano ele enfrenta o tema da informática e da mudança de natureza efetuada pela própria técnica. Porquet sintetiza o que o seu mestre viu: "Se a primeira era uma 'aposta', esta constitui hoje, no interior da sociedade, um 'sistema'. Unificando todos os subsistemas (ferroviário, postal, aéreo, telefônico, de produção de energia, militar etc.), o computador permitiu o nascimento de um Todo organizado, que modela, transforma, controla e tende, pouco a pouco, a se confundir com ele. Cada setor já é interconectado, condiciona e é condicionado. Dados bancários, tratamento de fluxos enormes de informação, redes de comunicação imediatas: a informática permite o crescimento ilimitado das organizações econômicas e administrativas".
Não é preciso cair no lugar comum que vê a sociedade transformada em uma megamáquina em que nós desenvolvemos as mesmas funções das engrenagens. Pelo contrário, é o momento de nos lembrarmos que "a liberdade desaparece pouco a pouco".
Utilizamos as palavras de Porquet: "No interior do sistema, sob a condição de consumir, de trabalhar e de se divertir de modo conforme às suas diretivas, o homem seguramente é livre e soberano. Mas essa liberdade é artificial e sob controle". Não é fácil sair da aproximação, adotar atitudes diferentes das consideradas normais, já que os meios técnicos, multiplicando-se, "fazem desaparecer todo fim", e o sistema "autogenerativo" criado é cego.
Por quê? Ainda com as palavras de Porquet: "Ele não sabe aonde vai, não tem nenhum projeto. Não cessa de crescer, de artificializar o homem e o ambiente, de nos levar rumo a um mundo sempre mais imprevisível e alienante. Sem corrigir os próprios erros". Entender-se-á porque o sistema técnico de Ellul de 1977 foi acolhido por um silêncio absoluto.
Nessas páginas, lê-se ainda intuições fulminantes, atualíssimas. Eis algumas: a tirania dos números, o regionalismo (visto como um produto do sistema técnico), a impossibilidade de parar as guerras quase "bancos de prova" da técnica irão chegar; as diversões, "função respiratória do sistema", terão importância sempre maior. E ainda: "Nesse mundo, o homem trabalhará mais do que nunca", haverá problemas econômicos enormes provocados pela automação com crises imprevistas e euforias imprevisíveis, criar-se-á mais tempo, mas se perderá o espaço.
Enfim, é uma veleidade conciliar técnica e democracia. Por quê? Segundo Ellul, a democracia não consegue controlar a técnica e, consequentemente, o desenvolvimento que nos envolve foge às suas regras. Em síntese: a técnica procede sem levar em conta a democracia. Além disso, "é preciso dissipar o mito de que ela aumenta as possibilidades de escolha", porque, se podemos nos distrair entre mil eletrodomésticos e centenas de detergentes, o nosso papel no corpo social, no que se refere a funções e condutas, sofreu "uma considerável redução".
Há perguntas que continuam em aberto à margem dessas páginas. O nosso sistema conseguirá se autocorrigir? Ou o homem deverá fazer isso? Em um primeiro tempo, Ellul pensou que seria possível "abandonar os binários do crescimento econômico". Depois, compreendeu que uma revolução como essa teria sido impossível. Melhor, se deu conta de que as próprias religiões "são apagadas pelo aparecimento de um misticismo de perfumaria e de novos deuses".
Profetizando a era da Internet que está diante de nós, afirmava – lembra Porquet – que a técnica "busca fazer com que acreditemos que a informação e o fato de sermos documentados são a coisa própria da cultura, mas não é verdade". Enfim, a última fraude. Ele se dá conta de que, talvez, há, novamente, muita liberdade à venda. E qualquer um a compra. Todos os dias. parisiense" que acreditava muito em
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