"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

segunda-feira, dezembro 08, 2008

SANTA CATARINA: O PERIGO AGORA É O AMIANTO

Atualizado em 08 de dezembro de 2008 às 14:25 | Publicado em 08 de dezembro de 2008 às 13:25

por CONCEIÇÃO LEMES, especial para o Viomundo

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Blumenau, 26/11/2008, foto de James Tavares/SECOM

As chuvas torrenciais e ininterruptas deram uma trégua, o sol reaparece e a população das áreas castigadas pelas inundações em Santa Catarina começa a retornar para casa. É hora da faxina. Também de reconstruir o que as chuvas e as enchentes não destruíram nem soterraram. Depois de enfrentar o risco de adquirir doenças infecciosas, como leptospirose e hepatite A, transmitidas pelo contato com água contaminada, têm outro inimigo pela frente. Só que, além de desconhecerem-no, os seus malefícios se manifestarão daqui a muitos anos.

“Muitas das casas atingidas tinham telhas e caixas d’ água de amianto. A tendência dos moradores é o reaproveitamento dos produtos sem cuidados necessários”, alerta o engenheiro Ivan Joppert Jr., professor de Mecânica do Solo e Fundações da Universidade Mackenzie, em São Paulo. “Infelizmente, são vítimas potenciais para câncer de pulmão e mesotelioma no futuro.” Mesotelioma é um tumor maligno que pode atingir a pleura, peritônio e pericárdio. Agressivo, incurável e fatal, pode aparecer 20, 30, 40, até 50 anos após o primeiro contato com amianto.

Schirlei Azevedo Ribeiro, militante dos movimentos de Mulheres Trabalhadoras Urbanas e de Saúde do Trabalhador de Santa Catarina, prevê esta “reprise”: “As pessoas pegarão os restos de telhas que acharem nos escombros, cortarão em pedaços aproveitáveis, limparão com vassoura ou escovão e voltarão a recobrir suas casas. Além do pó do amianto aspirado na manipulação, as suas fibras já vão soltinhas, para dentro de casa. Aí, circularão no ambiente doméstico, pondo em risco a saúde dessas pessoas”.

"Boa parte das casas nas encostas e nos morros é de famílias de baixa renda e recobertas com amianto”, avisa o médico, especialista em saúde pública e em medicina do trabalho e deputado estadual Jailson Lima da Silva (PT-SC). “O soterramento das telhas e caixas d’água é uma tragédia a mais, que as autoridades do Estado não estão se dando conta.”

Não é à toa que o presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (colocar o link por favor, www.abrea.org.br), Eliezer João de Souza, adverte: “Perigo à vista em Santa Catarina. Os detritos e escombros contendo amianto são problema de saúde pública”.



RESÍDUOS CONTÊM PRODUTO CANCERÍGENO

Basta um vento ou uma chuva mais forte para muita telha de amianto ir para os ares e espatifar no chão em pedaços. Junto, a idéia equivocada que bastante gente tem de que o produto à base da fibra cancerígena é “eterno”.

“Ao se quebrar em pedaços, a telha gera poeira de amianto. E ao reaproveitá-la, gera-se mais poeira ainda”, vai ao x da questão a engenheira Fernanda Giannasi, auditora fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego em São Paulo e coordenadora da Rede Virtual Cidadã pelo Banimento do Amianto para a América Latina. “O risco de novas instalações com produtos velhos aumenta o perigo. O amianto está muito mais solto do que quando a telha era nova e havia uma camada de proteção de cimento. Uma vez quebrada ou deteriorada, as fibras do mineral ficam mais expostas e os cuidados devem ser redobrados.”

O ideal é que nas edificações destruídas as telhas de amianto sejam substituídas por produtos isentos de amianto.

“Aqui em Santa Catarina já combatemos há um bom tempo o uso da fibra assassina nas construções”, informa o deputado Jailson Lima da Silva. Ele e a deputada Ana Paula Lima (PT-SC) têm um projeto de lei, tramitando na Assembléia Legislativa, que proíbe o uso do amianto no Estado. “Precisamos que seja aprovado urgentemente.”

Se for inevitável o reaproveitamento das telhas e caixas d’água existentes, é fundamental que as pessoas se protejam para cortar e/ou limpar as telhas que já têm. O engenheiro Ivan Joppert Júnior recomenda o uso de máscaras especiais, touca (para o pó não ficar no cabelo), camisas de manga longa e calça comprida.

“Não faça esse serviço dentro de casa nem pegue seu filho ou abrace alguém com essa roupa. Roupas e máscaras devem ser descartadas em seguida”, orienta Joppert, e defende. “O Sindicato dos Engenheiros de Santa Catarina deveria imediatamente criar uma força tarefa, para orientar a defesa civil e a população das áreas atingidas quanto ao manuseio dos materiais contendo amianto.”

A resolução nº 348 do Conselho Nacional do Meio Ambiente, o Conama, do Ministério do Meio Ambiente, não permite a reutilização desses materiais contendo amianto, classificados na Classe D: “são resíduos perigosos oriundos do processo de construção, tais como tintas, solventes, óleos e outros ou aqueles contaminados ou prejudiciais à saúde oriundos de demolições, reformas e reparos de clínicas radiológicas, instalações industriais e outros, bem como telhas e demais objetos e materiais que contenham amianto ou outros produtos nocivos à saúde”.

Segundo a resolução nº 348 do Conama, os materiais com amianto devem ser descartados de maneira adequada em aterros especiais para lixo perigoso, pois seus destroços e resíduos contêm a fibra reconhecidamente cancerígena à saúde humana sob todos os tipos e formas.

“Por isso, conclamamos todas as autoridades catarinenses envolvidas nos trabalhos de remoção dos escombros para que providenciem o manuseio adequado dos entulhos com amianto, seu transporte e destinação final em aterro para lixo perigoso”, faz um apelo Fernanda Giannasi. “É o único jeito de se evitar que lá adiante, em 2040, 2050, as autoridades de saúde tenham de contabilizar novas vítimas provenientes desta tragédia de 2008. Será então uma dupla tragédia para o bravo povo de Santa Catarina!”

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Itajaí, 26/11/2008, foto de James Tavares/SECOM

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