Com a queda do preço do petróleo, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, chegará nesta sexta à Cúpula das Américas, em Trinidad e Tobago, às voltas com questionamentos sobre a sustentabilidade da petrodiplomacia, lastro do considerável aumento de sua influência na América Central e Caribe.
A reportagem é de Flávia Marreiro e publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, 11-04-2009.
Os ajustes no Orçamento - calculado com o barril a US$ 60 quando ele fechou a semana em US$ 46 - e notícias de problemas de caixa na PDVSA, a megaestatal responsável por 94% das exportações venezuelanas, acenderam as primeiras luzes de alerta sobre a Petrocaribe, a mais famosa ação da era de bonança chavista, que vende petróleo barato a 17 países.
Também vieram maus sinais de um programa menor, mas estratégico na propaganda chavista: a venda de petróleo subsidiado nos EUA. Em janeiro, o projeto de US$ 100 milhões que distribuiu 200 mil barris de petróleo/ano foi cancelado. Dias depois foi retomado com os venezuelanos sublinhando seu "sacrifício" para mantê-lo.
O caso da Petrocaribe, porém, é mais grave por ser o mais bem-sucedido programa da petrodiplomacia, que abarca desde a aliada de primeiríssima hora Cuba até países longe de ter marcada afinidade ideológica, como o Panamá, que acaba de ter o pedido de adesão, feito no mês passado, aceito.
O programa avançou sobre a América Central e Caribe na esteira da escalada do preço do petróleo e no vácuo da presença americana na região. Segundo dados oficiais de julho, a iniciativa já entregou 59 milhões de barris de petróleo, gerando economia de US$ 921 milhões aos beneficiários desde 2005.
Mas o arrocho nas contas começa a fazer estrago. Caracas anunciou que terá de abrir mão dos cronogramas de obras de refinarias no Equador e na Nicarágua - nesta última, a usina foi batizada com o nome de Supremo Sonho de Bolívar. O sonho, no caso, custaria de US$ 4 bilhões a US$ 10 bilhões, e deveria estar pronto em 2013.
A Venezuela também anunciou ambiciosos projetos de investimentos em Cuba, como a ampliação de construção de uma refinaria em Cienfuegos e outra em Santiago.
"Há pouca transparência nos números da PDVSA e da Petrocaribe. Mas o que se pode dizer é que não haverá dinheiro para esses investimentos", diz o analista Jorge Piñón, ex- ex-presidente para a América Latina da petroleira Amoco Oil, que acaba de voltar de uma conferência sobre petróleo em Havana.
O governo diz que os contratos da Petrocaribe estão mantidos. Mas a Costa Rica, cuja adesão fora acertada em julho, não parece segura. O presidente Óscar Arias fez em fevereiro uma cobrança pública da situação: "Nós temos de perguntar a Chávez se ele deseja continuar com isso. [...] [Chávez] não parece tão entusiasta como no passado em ampliar o programa", disse ele à Bloomberg.
A preocupação de Arias e de seus colegas centro-americanos não é com o futuro imediato, mas com uma eventual alta no volátil mercado de combustível. Bastante debilitados pela crise mundial, eles sofreriam muito com o baque. "Os preços baixos do petróleo ameaçam a Petrocaribe. Os países com governos de esquerda como Cuba, Equador e Bolívia estão em segurança, mas os países do Caribe estão sob maior risco", diz Kate Parker, analista para a Venezuela da Economist Intelligence Unit, ligada à revista "Economist".
Erasto Almeida, consultor para a América Latina do Eurasia Group, prevê que Chávez ainda tenha alguma reserva para gastar em 2009, mas que a situação será outra no ano que vem. "Não acredito que ele vá eliminar o programa, mas pode restringi-lo. A PDVSA está com menos receita, e o governo, com a queda de arrecadação interna, precisa ainda mais dela."
Há ainda a pressão interna. Com o anúncio de reajuste no Orçamento, a oposição redobrou as cobranças para que Chávez pare de ser o Papai Noel do petróleo na região. "O mais importante não é quanto custa efetivamente a iniciativa, mas o fato de que o país poderia ganhar mais se o petróleo fosse vendido a preço de mercado", diz Parker.
Caracas diz que o volume entregue à Petrocaribe corresponde a 5% do que exporta e que pode manter o programa. Mas num cenário de aperto fiscal, Chávez não parece disposto a suavizar ações nem retórica. Em março, ocupou uma fábrica de arroz, tomou o controle de portos e aeroportos administrados regionalmente por opositores e, no front externo, tem oscilado nas críticas ao novo presidente americano, Barack Obama - com quem estará cara a cara pela primeira vez na Cúpula das Américas.
A reportagem é de Flávia Marreiro e publicada pelo jornal Folha de S.Paulo, 11-04-2009.
Os ajustes no Orçamento - calculado com o barril a US$ 60 quando ele fechou a semana em US$ 46 - e notícias de problemas de caixa na PDVSA, a megaestatal responsável por 94% das exportações venezuelanas, acenderam as primeiras luzes de alerta sobre a Petrocaribe, a mais famosa ação da era de bonança chavista, que vende petróleo barato a 17 países.
Também vieram maus sinais de um programa menor, mas estratégico na propaganda chavista: a venda de petróleo subsidiado nos EUA. Em janeiro, o projeto de US$ 100 milhões que distribuiu 200 mil barris de petróleo/ano foi cancelado. Dias depois foi retomado com os venezuelanos sublinhando seu "sacrifício" para mantê-lo.
O caso da Petrocaribe, porém, é mais grave por ser o mais bem-sucedido programa da petrodiplomacia, que abarca desde a aliada de primeiríssima hora Cuba até países longe de ter marcada afinidade ideológica, como o Panamá, que acaba de ter o pedido de adesão, feito no mês passado, aceito.
O programa avançou sobre a América Central e Caribe na esteira da escalada do preço do petróleo e no vácuo da presença americana na região. Segundo dados oficiais de julho, a iniciativa já entregou 59 milhões de barris de petróleo, gerando economia de US$ 921 milhões aos beneficiários desde 2005.
Mas o arrocho nas contas começa a fazer estrago. Caracas anunciou que terá de abrir mão dos cronogramas de obras de refinarias no Equador e na Nicarágua - nesta última, a usina foi batizada com o nome de Supremo Sonho de Bolívar. O sonho, no caso, custaria de US$ 4 bilhões a US$ 10 bilhões, e deveria estar pronto em 2013.
A Venezuela também anunciou ambiciosos projetos de investimentos em Cuba, como a ampliação de construção de uma refinaria em Cienfuegos e outra em Santiago.
"Há pouca transparência nos números da PDVSA e da Petrocaribe. Mas o que se pode dizer é que não haverá dinheiro para esses investimentos", diz o analista Jorge Piñón, ex- ex-presidente para a América Latina da petroleira Amoco Oil, que acaba de voltar de uma conferência sobre petróleo em Havana.
O governo diz que os contratos da Petrocaribe estão mantidos. Mas a Costa Rica, cuja adesão fora acertada em julho, não parece segura. O presidente Óscar Arias fez em fevereiro uma cobrança pública da situação: "Nós temos de perguntar a Chávez se ele deseja continuar com isso. [...] [Chávez] não parece tão entusiasta como no passado em ampliar o programa", disse ele à Bloomberg.
A preocupação de Arias e de seus colegas centro-americanos não é com o futuro imediato, mas com uma eventual alta no volátil mercado de combustível. Bastante debilitados pela crise mundial, eles sofreriam muito com o baque. "Os preços baixos do petróleo ameaçam a Petrocaribe. Os países com governos de esquerda como Cuba, Equador e Bolívia estão em segurança, mas os países do Caribe estão sob maior risco", diz Kate Parker, analista para a Venezuela da Economist Intelligence Unit, ligada à revista "Economist".
Erasto Almeida, consultor para a América Latina do Eurasia Group, prevê que Chávez ainda tenha alguma reserva para gastar em 2009, mas que a situação será outra no ano que vem. "Não acredito que ele vá eliminar o programa, mas pode restringi-lo. A PDVSA está com menos receita, e o governo, com a queda de arrecadação interna, precisa ainda mais dela."
Há ainda a pressão interna. Com o anúncio de reajuste no Orçamento, a oposição redobrou as cobranças para que Chávez pare de ser o Papai Noel do petróleo na região. "O mais importante não é quanto custa efetivamente a iniciativa, mas o fato de que o país poderia ganhar mais se o petróleo fosse vendido a preço de mercado", diz Parker.
Caracas diz que o volume entregue à Petrocaribe corresponde a 5% do que exporta e que pode manter o programa. Mas num cenário de aperto fiscal, Chávez não parece disposto a suavizar ações nem retórica. Em março, ocupou uma fábrica de arroz, tomou o controle de portos e aeroportos administrados regionalmente por opositores e, no front externo, tem oscilado nas críticas ao novo presidente americano, Barack Obama - com quem estará cara a cara pela primeira vez na Cúpula das Américas.
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