"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

A busca do fundo do poço

Blog do Luis Nassif - 12/02/09

O grande desafio da economia mundial é descobrir o fundo do poço. Enquanto isto não ocorrer, a economia mundial ficará à mercê do círculo vicioso da deflação, que opera mais ou menos assim:

1. A crise provoca uma queda abrupta nos preços dos ativos - que vinham sendo turbinados antes.

2. Caindo os preços, em um primeiro momento provocam desequilíbrios no mercado futuro, nos swaps, nas operações com derivativos. Para cobrir a posição em um mercado, investidores vendem ativos em outro, em um efeito cascata.

3. Em um segundo momento, o jogo deriva para a economia real. Empresas ficam com patrimônio líquido negativo, as garantias bancárias se tornam insuficientes, a queda na atividade global provoca novas rodadas de inadimplência. Com isso, preços de empresas e de ativos continuam caindo.

4. Há sempre os “pescadores”, aguardando boas oportunidades, que costumam brecas essas movimentos. Entram comprando, contrabalançando a queda nos preços por excesso de oferta. Só que o pescador só entrará no jogo quando perceber que o movimento de queda terminou.

5. No dia em que estiver clara a percepção de que se bateu no fundo do poço, a recuperação econômica será relativamente rápida, graças a esses movimentos de realocação de capitais. O desafio é saber quando esse dinheiro chegará. Nesse movimento de espiral, cada dia de vida nunca é mais, é sempre menos. Pelo menos até se chegar ao fundo do poço.

Dos alertas pré-Lehmann

Coluna Econômica - 21/07/2008

Na sexta-feira, o dólar atingiu a cotação mais baixa desde 1999 - véspera da maxidesvalorização. Se se corrigir o valor pela inflação do período, se terá a mais baixa cotação das últimas décadas.

Durante a semana, estudos da OMC (Organização Internacional do Comércio) indicaram que as exportações brasileiras cresceram menos do que o comércio mundial. Manteve-se o fluxo de dólares exclusivamente devido ao aumento no valor das cotações; do lado da quantidade, houve decréscimo mesmo nas exportações de produtos primários.

Significa que, quando houver a deflação mundial (queda abrupta nos preços das commodities) o país estará sinucado.

08/08/08 10:14

O guardião da imprevisibilidade

Não se trata de engenharia de obras feitas, porque escrevi várias vezes no Blog: havia uma tendência óbvia de queda do ritmo da inflação no segundo semestre. Primeiro, pela queda da renda, motivada pela inflação de alimentos. Segundo, pelo fim da própria inflação de alimentos.

Ora, as commodities internacionais estavam no preço mais alto da história. No primeiro semestre houve um “overshooting” expressivo. Qualquer especialista consultado tinha dois cenários para o segundo semestre: o pessimista, no qual considerava que os preços permaneceriam nesse patamar; e o otimista, considerando que haveria uma queda nas cotações. Tinha-se claro o quadro de desaquecimento mundial.

Tinha-se a possibilidade, não de todo clara, do dólar voltar a se apreciar - atraindo recursos aplicados em commodities.

No cenário pessimista, não haveria inflação de alimentos (já que inflação é variação); no otimista, haveria deflação.

Porque, então, o mercado inteiro apostando em inflação mais alta, em dificuldade para se atingir a meta, espalhando um terrorismo amplo? Porque, na Pesquisa Focus, o objetivo final do analista não é acertar individualmente a inflação: é chegar o mais perto possível da inflação que ele julga estar na cabeça do Banco Central.

Por Pedro

“No dia em que estiver clara a percepção de que se bateu no fundo do poço, a recuperação econômica será relativamente rápida” (LN).

Não concordo. A afirmação parte do postulado de que se trata de uma crise cíclica, dessas que possuem o condão de restaurar o equilíbrio do sistema. A crise, nessa perspectiva, baseia-se na idéia de que haverá uma espécie de saneamento econômico, promovendo logo depois a recuperação da atividade econômica num patamar mais “realista”: os ganhos fictícios, sem lastro na economia real, desaparecem e dão lugar a um crescimento da economia real, forjado pelo “veredito do mercado”.

Trata-se, na verdade, de uma crise ESTRUTURAL, que coloca em xeque não apenas os níveis de atividade econômica (produção, comércio, emprego etc.) mas a própria estabilidade do sistema capitalista. Isto porque seus efeitos se estendem para além da atividade econômica em sentido estrito, e tocam nas relações sociais, no meio ambiente, na correlação de forças entre os países envolvidos etc.

Os trabalhadores não aceitarão pagar os custos da crise (vejam o que está acontecendo na França, por exemplo). Nos EUA, existem algumas fábricas que foram ocupadas por operários. No Brasil, os trabalhadores da GM estão dando sinais de recuperação da atividade grevista. Essa crise é também uma crise de sociabilidade, que pode levar ao questionamento do própria sociedade de consumo de massa. A GM e a Toyota fabricaram, cada uma, cerca de 9 milhões de veículos somente no ano passado. Ora, será mesmo possível estender esse padrão de consumo de massa para bilhões de chineses, indianos e outros habitantes de países ditos emergentes? Haverá recursos para tantos? Ou será que teremos uma repetição do maio de 68, quando os protestos de trabalhadores e estudantes franceses, mais do que reivindicações por melhores salários, foram o resultado de um profundo mal-estar com o assim chamado “american way of life”???

Bom, não pretendo fazer um exercício de futurologia. A história está sempre aberta. Mas não compartilho do otimismo de que a restauração do equilíbrio ocorrerá assim tão simplesmente. Isso tem o sentido de wishful thinking ( http://pt.wikipedia.org/wiki/Wishful_thinking ). Uma análise dos desdobramentos da crise exige uma discussão exaustiva. A crise de 1929 só foi entendida décadas depois. Em Davos, na Suíça, parafrasearam Sócrates até a exaustão: “só sabemos que nada sabemos”. Bom, é isso. Só procurei estabelecer um contraponto, visando contribuir um pouquinho para o debate.

Comentário

Obviamente quando falo em fundo do poço, me refiro especificamente ao fim da crise da economia real. Mas é evidente que as mudanças que vêm por aí, como salienta o Pedro, são muito mais amplas e profundas.

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