Segundos depois que um visitante entra numa sala de aula da escola Resindo Jaya, os 60 estagiários de enfermagem, estudando em silêncio às vésperas de sua partida para Taiwan, põem-se de pé e entoam alegremente em recém-aprendido mandarin: "Bom dia. Como vai? É um prazer".
A reportagem é de John Aglionby, publicada pelo Financial Times e reproduzida pelo jornal Valor, 11-02-2009.
Do lado de fora, meia dúzia de homens que se preparam para trabalhar em embarcações pesqueiras taiwanesas mostram-se igualmente animados. "De que crise econômica você está falando?" diz Burhanuddin, 23 anos. "Estou indo para começar um bom trabalho, e por isso estou contente".
Satia Sila, proprietário dessa agência de emprego para trabalhadores migrantes de Jacarta, na Indonésia, permanece cautelosamente otimista em relação a 2009. "Este será um ano difícil e teremos de agir de modo mais profissional para termos sucesso", diz ele. "Mas até agora o impacto da recessão mundial não nos atingiu."
Em toda a Ásia, já existem muitos sinais de que o desaquecimento econômico mundial está produzindo um impacto sobre os trabalhadores. Mas o que paira ameaçadoramente sobre a região é a dúvida sobre o que acontecerá aos milhões de trabalhadores migrantes, que cruzam fronteiras nacionais em busca de trabalho fora e cujas remessas de dinheiro tornaram-se uma grande fonte de renda para países como as Filipinas.
Até agora, o otimismo de Sila é o mesmo que vem repercutindo em todo o setor de trabalhadores migrantes asiáticos, apesar das expectativas de que centenas de milhares dos estimados 45 milhões de trabalhadores na região que cruzam fronteiras para trabalhar - até 80 milhões, incluindo os trabalhadores sem documentos - estejam perdendo seus empregos.
Manolo Abella, um especialista da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em trabalhadores migrantes na região, diz as remessas de dinheiro tenderam a sobreviver em crises anteriores, e um recente estudo do Banco Mundial previu que os fluxos de remessas mundiais, que totalizaram cerca de US$ 283 bilhões no ano passado, deverão encolher 1% neste ano.
Abella diz que o volume de remessas de trabalhadores migrantes para seus países de origem continua em alta, indicando que a maioria deles manteve, até agora, seus empregos.
Em Taiwan, substancial empregador de trabalhadores estrangeiros, dados oficiais revelam que o número de migrantes empregados cresceu 2% no fim de 2008, em comparação com 2007.
Filipinas, uma das maiores fornecedoras de migrantes, com 9 milhões de seus cidadãos trabalhando no exterior, diz acreditar que as remessas continuem a crescer ao longo de 2009 - embora autoridades digam que o crescimento ficará provavelmente entre 6% e 9%, em comparação com um surto de 15%, para US$ 15 bilhões, nos primeiros 11 meses de 2008.
Existem crescentes temores, porém, de que a velocidade do desaquecimento asiático em breve alcançará os migrantes, cuja falta de capacitação especializada e frequentemente frágil status empregatício os deixam vulneráveis a demissões em meio a um grave desaquecimento econômico.
Países da Ásia Meridional poderão estar entre os mais adversamente impactados. O Nepal obtém 17% de seu Produto Interno Bruto (PIB) de remessas do exterior, enviadas por mais de 2,5 milhões de trabalhadores, ao passo que as autoridades indianas temem que centenas de milhares de migrantes no Oriente Médio serão mandados para casa neste ano.
Harry Juliandy, gerente na Lansina, outra agência de empregos em Jacarta, diz que o país hospedeiro mais atingido é o Dubai. "Omã, Qatar e Arábia Saudita não estão reportando quaisquer problemas de monta, mas a coisa está feia no Dubai, especialmente na construção civil. Tudo ia bem até outubro. Então, em novembro, os salários foram pagos com dez dias de atraso, e, em dezembro, centenas [de meus trabalhadores] foram mandados para casa", diz ele.
Autoridades indonésias estimam que as remessas de trabalhadores no exterior poderão cair até 10% neste ano, de US$ 8,2 bilhões no ano passado, embora digam, otimisticamente, que o declínio poderá ser de apenas 5%. isso porque os migrantes que trabalham em setores informais de economias estrangeiras devem ganhar mais do que os empregados em fábricas ou construção civil.
"Nossa análise atual é que as demissões prosseguirão no setor formal, à medida que fábricas deixam de operar, mas o setor de trabalho informal continuará a crescer", diz William Gios, coordenador regional do Fórum dos Migrantes na Ásia, uma rede regional de organizações que trabalham em defesa dos trabalhadores migrantes.
"Eles poderão ter de negociar salários inferiores ou migrar para outras ocupações, como as de motoristas ou de pessoal de limpeza, mas devem sobreviver", diz ele.
Gios também adverte que a ausência de um surto de trabalhadores retornando a seus países não significa que estejam todos ainda trabalhando em tempo integral. "Pode ser mais fácil, para eles, esperar e torcer para que as coisas melhorem. Ou podem estar ganhando uma fração do que recebiam poucos meses atrás", diz.
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