"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Definitivo: CONAR suspende propaganda enganosa do amianto

Site do Azenha - Atualizado em 12 de fevereiro de 2009 às 22:22 | Publicado em 11 de fevereiro de 2009 às 19:55

Por CONCEIÇÃO LEMES, especial para o Viomundo

Em sessão realizada hoje cedo, a Primeira Câmara Técnica do Conselho de Ética do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária – Conar – suspendeu definitivamente a campanha publicitária Amianto crisotila – a fibra mineral que faz o Brasil crescer, patrocinada pelo Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC), instituição que faz o lobby a favor do mineral cancerígeno.

A decisão foi unânime: a campanha fere os princípios éticos da publicidade. Marina Júlia de Aquino, presidente-executiva do IBC, estava presente. Ela foi advertida por usar, pela segunda vez, propaganda que já havia sido proibida em 2004. Marina Júlia foi alertada também de que isso poderá gerar jurisprudência.

A denúncia foi feita pela Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto – a Abrea

“A defesa em favor dos anúncios foi estritamente econômica. Insistiram que havia uma guerra comercial para substituir o amianto por fibra sintética e o objetivo deles era apenas fomentar a economia”, relata o advogado Alexandre Lindoso, que representa a Abrea nesta ação. “Para isso, utilizaram o argumento de que o amianto crisotila é inócuo à saúde, o que é mentira. Está comprovado cientificamente por vários estudos no mundo inteiro que todo tipo de amianto, inclusive a crisotila, faz mal à saúde, é cancerígeno.”

“Esta nova vitória é resultado da luta de gente honrada – ex-empregados, trabalhadores, familiares, alguns advogados e uns poucos profissionais de saúde --, que resiste a todo tipo de pressão e chantagem vindas do ainda fortíssimo lobby do amianto em nosso País”, comemora a adverte Fernanda Giannasi, auditora fiscal do Ministério da Saúde e Emprego (MTE), em São Paulo, e coordenadora da Rede Virtual Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina. “Esta vitória dedicamos às milhares de vítimas da fibra assassina. O bravo José Roncadin é uma delas.”

O “seo” Roncadin é um verdadeiro mostruário do mal que o amianto faz. Seu estado de saúde é delicadíssimo. A história dele está no post abaixo.

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Amianto: Conar julga campanha publicitária
por CONCEIÇÃO LEMES, especial para o Viomundo

Em 2 de dezembro de 2008, o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária – Conar -- suspendeu a campanha publicitária Amianto crisotila – a fibra mineral que faz o Brasil crescer. Havia dois meses que estava sendo veiculada especialmente nas rádios Band News Fm e CBN, sob o patrocínio do Instituto Brasileiro do Crisotila, instituição que faz o lobby a favor do mineral cancerígeno.

A denúncia contra os anúncios, publicada em o Viomundo, foi feita pela Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto.

“Existe notório abuso da liberdade de expressão comercial, em que o uso do amianto, que é argüido, pelo menos, como um grave risco, é apresentado como benemérita qualidade”, afirma o relator Pedro Kassab em seu despacho ao Conar. Em conseqüência, a campanha publicitária foi suspensa por liminar. Pedro Kassab é médico, foi presidente da Associação Médica Brasileira e da Associação Médica Mundial. É decano do Conselho de Ética do Conar, órgão ao qual está ligado desde a criação, em 1980, como representante de consumidores.

Nesta quinta-feira, dia 12, às 10h e 30, a campanha será julgada em definitivo pelo plenário do Conar. Entre outras inverdades, os anúncios alardeiam:

1) Dezenas de estudos nacionais e internacionais comprovam: manuseado de forma correta o amianto Crisotila não causa mal à saúde.

2) Pessoas que começaram a trabalhar após a década de 80, não tem nenhum caso descrito de alguma doença relacionado ao amianto.

“Trata-se de propaganda enganosa”, afirma o advogado Alexandre Lindoso, que representa a Abrea nesta ação. “Ao anunciar que o amianto é inócuo e não traz danos à saúde, ela passa informações inverídicas, induzindo a população a erro. Portanto, fere os princípios éticos da publicidade.”

“Essa propaganda é um crime contra a saúde pública brasileira”, adverte Fernanda Giannasi, auditora fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em São Paulo, e coordenadora da Rede Virtual Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina. “Esperamos que a plenária do Conar confirme a nossa vitória. Ela é resultado da luta de gente honrada, que resiste a todo tipo de pressão e chantagem vindas do lobby do amianto em nosso País. O senhor Roncadin é um exemplo dela.”

RONCADIN: “MANDARAM UMA FOLHA EM BRANCO PRA EU ASSINAR!”
Roncadin é o “seo” José Roncadin, 74 anos.

“Trabalhei na Eternit de 1963 a 1966; em 1997, fiquei sabendo por um amigo que a empresa estava realizando exames em ex-empregados. Fui fazer. Deu placas pleurais”, revela. “Quando descobriram isso, me chamaram para um acordo [extrajudicial]. Tinha um monte de folhas de papel. No meio, uma folha totalmente em branco para eu assinar. Não assinei. Se havia uma folha em branco era porque tinha cachorrada no meio. Eu não freqüentei escola, mas hoje leio qualquer livro, jornal. Só não sei escrever direito.”

Roncadin é símbolo de dois retratos.

Primeiro, o da forma como os trabalhadores e ex-empregados de mineração e produção de artefatos de amianto são tratados no Brasil. Como freqüentemente são pessoas humildes, têm poder de barganha quase zero num jogo pesado de gigantes. Nele, vale tudo para livrar a cara do amianto.

Segundo, o do retrato das doenças relacionadas ao amianto. Em 1997, como disse, apareceram placas pleurais. São alterações que podem acarretar falta de ar, cansaço, dores nas costas e tosse com catarro. Em 1999, asbestose, ou fibrose pulmonar. O pulmão “endurece”, perdendo progressivamente a sua capacidade de se expandir. Provoca falta de ar, dor nas costas, cansaço, emagrecimento. Não tem cura, leva lentamente à morte. Em 2001, apareceu um nódulo no pulmão. Em agosto de 2008, teve confirmado o diagnóstico de mesotelioma de pleura. Trata-se de um tumor da membrana que reveste o pulmão.

Ou seja,as doenças foram progredindo no “seo” Roncadin: no início apenas placas calcificadas chamadas de “benignas” pela indústria, ou marcas de exposição. Não tardou a aparecer a asbestose, que traz muito sofrimento. Finalmente, a mais cruel das doenças – o temível mesotelioma. Por seu trabalho na fábrica de Osasco, o “seo” Roncadin ganhou de “presente” um mostruário de todas as doenças do amianto.


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Foi numa das internações no Instituto do Coração, o Incor de São Paulo, que Roncadin recebeu a confirmação do diagnóstico de mesotelioma


“De manhã, eu costumava andar bastante. Ia e voltava a uma padaria longe de casa, só para fazer minha caminhada diária”, conta. “Até que um dia não consegui. Deu uma dor tremenda no peito, no lado direito. Eu andava um pouquinho, tinha que parar. Fui ao médico, ele fez chapa e disse: você está com derrame pleural por causa do amianto.”

“A ‘vantagem’ é que o médico colocou amianto no meu laudo”, diz. “Em Osasco tem muita gente que morreu com insuficiência pulmonar. Só que não colocavam o amianto como causa. Tenho um colega que fez acordo extrajudicial para pegar o plano de saúde. Agora, apareceu câncer no pulmão. É analfabeto. Assinou o acordo com o dedão!”

O mesotelioma de pleura aparece 30, 40, até 50 anos após a primeira exposição ao amianto. É gravíssimo, incurável. Após o diagnóstico, a pessoa vive, no máximo, mais 1 ano. Roncadin não pôde ser operado; seu tumor estava muito avançado. Está fazendo quimioterapia. O seu estado é delicadíssimo.

“Outro dia ele nos deixou de queixo caído”, emociona-se Eliezer João de Souza, 67 anos, presidente Abrea, outra vítima do amianto. “Fomos ao Parque do Carmo [na Zona Leste da cidade de São Paulo] fazer campanha pelo banimento. “O Roncadin não parou, mesmo com náuseas após mais uma sessão de quimioterapia. Sob sol escaldante, ficou o tempo inteiro distribuindo bexigas [balão de gás] para as crianças. Nós não queríamos, preocupados com seu delicado estado de saúde. Mas ele acha tem que fazer isso para que as futuras gerações não sejam como ele, vítimas da fibra cancerígena, assassina.”

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Roncadin no Parque do Carmo: “Não quero que as futuras gerações sejam vítimas da fibra assassina como eu”.

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