"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

quarta-feira, março 04, 2009

A farsa do "não falaremos com o Hamás"

Site do Azenha - Atualizado e Publicado em 02 de março de 2009 às 22:36

A farsa do "não falaremos com o Hamás"*

Robert Dreyfuss, The Nation, 2/3/2009, 10:13am - http://www.thenation.com/blogs/dreyfuss/413291

Pairando sobre os planos de Hillary Clinton para o Oriente Médio há dois movimentos radicais que não parecem interessados em apoiar o que Clinton suponha que seja uma 'solução-de-dois-Estados'. De um lado, o Hamás, que governa Gaza; de outro lado, o bloco Netanyahu-Lieberman, que em poucos dias estará governando Israel.

No Egito, ontem, Clinton repetiu a disposição de oferecer 900 mi de dólares à Cisjordânia e Gaza; 1/3 dessa quantia, para Gaza. E disse que todo o dinheiro será encaminhado mediante a Autoridade Palestina, não pelo Hamás, para "garantir que não acabe em mãos erradas":

"Trabalharemos com nossos parceiros palestinos, o presidente Abbas e o primeiro-ministro Fayyad, para suprir necessidades críticas, humanitárias, de orçamento, de segurança e de infra-estrutura. Temos trabalhado com a Autoridade Palestina para impor salvaguardas que garantam que os dólares sejam usados onde e para quem precise deles, e para que não acabem em mãos erradas."

Acrescentou que os EUA "buscarão vigorosamente uma solução de dois Estados, como solução para o conflito Israel-Palestina."

No total, essa conferência de doadores que Clinton está organizando espera reunir um pacote de 3 bilhões de dólares especificados para Gaza, o equivalente a 2.000 dólares para cada um dos 1,5 milhão de habitantes de Gaza. Dado que parte significativa do dinheiro será encaminhada através da Autoridade Palestina e Fayyad, ambos serão beneficiados, no mínimo, no campo do prestígio político. Mas Israel mantém inalterado o bloqueio de Gaza, o que impede que cheguem até lá todos os itens indispensáveis aos projetos de reconstrução, cimento, por exemplo.

O Egito está mediando contatos entre Israel e o Hamás, em busca de algum arranjo exequível, que ainda não apareceu no horizonte, porque tudo, hoje, depende do rumo que tome o governo Netanyahu, que jurou destruir o Hamás.

O Egito também lidera as negociações para reconciliar Hamás, Fatah e outros grupos do movimento nacional palestino.

Se o Egito for bem-sucedido nesse trabalho de mediação, então, o impasse estará completo e será total: o governo Obama mandará centenas de milhões de dólares para os palestinos, mesmo que, em termos oficiais e legais, as tais "mãos erradas" sejam parte da coalizão de governo?

O diálogo nacional palestino começará dia 10/3 no Cairo e inclui, é claro, Hamás, Fatah e vários grupos menores, inclusive, é claro, a Jihad Islâmica. Foram criados cinco comitês que trabalharão com vistas a "formar um governo de unidade nacional, reformar a OLP, reconstruir o aparelho de segurança, preparar eleições presidenciais e legislativas e o comitê de reconciliação."

Em teoria, parece muito fácil encaminhar diplomaticamente a solução dos problemas, para os EUA. Até hoje, os EUA só fizeram repetir que não conversariam com o Hamás, a menos que o partido reconhecesse Israel e desistisse da violência.

Se o Hamás chegar a algum acordo e unir-se ao Fatah na Autoridade Palestina, a presença do Hamás poderá ser usada pelos EUA para suspender qualquer ajuda, ou para fingir que nada vê e não sabe de nada; nesse caso, poderá manter a ajuda, sob a hipótese de que a Autoridade Palestina estaria cuidando dos contatos com Israel com vistas à solução dos dois Estados.

De fato, Israel já está conversando com o Hamás, resultado dos esforços de mediação do Egito, e se as conversações Hamás-Fatah derem certo, evidentemente o Hamás estará presente à mesa de negociações. A cada dia que passa vê-se mais claramente que "Não falaremos com o Hamás", de Clinton, é farsa.


* NOTA DE ATUALIZAÇÃO: A TV5, francesa, apresentou hoje longa entrevista com empresário palestino, cuja fábrica de computadores foi arrasada, reduzida a pó. E ele disse: "Eu não preciso do dinheiro dos EUA para reconstruir minha fábrica. Tenho dinheiro para reconstruí-la e tenho financiadores privados que me ajudarão a reconstruí-la. Preciso, isso sim, que os EUA cuidem de desarmar Israel, para eu ter certeza de que, depois de a minha fábrica estar reconstruída, ela não seja outra vez completamente destruída. Essa, sim, seria a grande ajuda que os EUA dariam, para pacificar a Região. O resto é farsa." (TV5 Monde, noticiário, pela NET TV, no Brasil, dia 2/3/2009.)

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