“O perdão parcial das dívidas dos pobres e o alongamento a juros baixos das dívidas da classe média e das empresas são soluções óbvias – são formas diretas de evitar o pagamento das dívidas; são uma forma muito mais eficiente de estimular a demanda do que isenções fiscais”, afirma Luiz Carlos Bresser-Pereira, professor emérito da Fundação Getulio Vargas e autor de Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994, em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, 02-03-2009.
A crise bancária de 2008 transformou-se, neste ano, em crise econômica e, em todo o mundo, a produção industrial cai e o desemprego aumenta, configurando uma clássica crise de demanda. É preciso, então, saber por que as famílias de repente reduziram o consumo, e as empresas, o investimento, e como agora reestimular a demanda. A primeira resposta a essas questões foi a de que os investidores e as famílias deixaram de investir porque os bancos, em crise, limitaram o crédito. Essa resposta, porém, é insuficiente para explicar uma redução tão violenta nas compras.
Uma segunda e sem dúvida boa resposta foi dizer que a demanda colapsou porque os investidores e as famílias perderam a confiança e decidiram limitar seus gastos adiáveis. Em outras palavras, em vez de continuarem a tomar emprestado para gastar, decidiram precaver-se diante do futuro incerto e não continuar a aumentar sua dívida. Mas o que nos conta Richard Koo em seu livro The Holy Grail of Macroeconomics (John Willey & Sons, 2008), a partir de seu estudo da depressão de 15 anos da economia japonesa, é que há uma terceira resposta: a demanda desmoronou porque as empresas e as famílias, além de pararem de se endividar, decidiram pagar suas dívidas. Em linguagem técnica, entraram em processo de desalavancagem.
Paulo Rabello de Castro, nesta página (25/2), estimulou que a desalavancagem já foi de US$ 10 trilhões, contra gastos adicionais do governo de US$ 5 trilhões. Richard Koo apresenta dados convincentes nesse livro para substanciar sua tese. Uma tese de enorme simplicidade, mas com consequências explosivas. Na medida em que os agentes econômicos logrem seu objetivo de pagar suas dívidas, a queda da demanda agregada ganha uma nova dimensão, obrigando os formuladores de política econômica a repensar todo o problema.
Sem dúvida, é preciso salvar os bancos e restabelecer a confiança; sem dúvida, é preciso reduzir a taxa de juros e aumentar a liquidez; sem dúvida, é preciso adotar uma decisiva política de expansão fiscal para aumentar o consumo e o investimento, mas é bem possível que todo esse esforço perca grande parte do seu efeito porque os agentes econômicos, em vez de aproveitar o estímulo fiscal para gastar, aproveitem-no para pagar dívidas.
Diante desse fato, que fazer além do que já está sendo feito? Os governos deverão colocar sua imaginação e sua inventividade a funcionar para perdoar ou alongar dívidas. Mas aliviar os devedores sem que os credores sejam punidos. O perdão parcial das dívidas dos pobres e o alongamento a juros baixos das dívidas da classe média e das empresas são soluções óbvias – são formas diretas de evitar o pagamento das dívidas; são uma forma muito mais eficiente de estimular a demanda do que isenções fiscais como aquelas que os republicanos lograram nos Estados Unidos. Não existem fórmulas simples de caminhar nessa direção, mas no pacote fiscal de Obama já existem previsões para aliviar a dívida dos devedores hipotecários.
Cada país terá que encontrar vários caminhos que levem nessa direção. Esses caminhos dependerão da criatividade e da coragem dos governantes e, na certa, terão um custo fiscal, mas o custo de uma depressão – de uma recessão prolongada e profunda – será sempre muito maior.
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