Desde que abandonou as ilusões de ser guru desenvolvimentista, com o fim das pretensões de Geraldo Alckmin, Luiz Carlos Mendonça de Barros tornou-se mercadista empedernido.
Sua defesa do Banco Central, na coluna de hoje na Folha (clique aqui), e sua crítica ao sentimento poliana do Ministro da Fazenda Guido Mantega, merecem uma reflexão – conforme expressão que ele gosta de usar.
Desde dezembro do ano passado, economistas e analistas vinham alertando para a temeridade da política de apreciação do real e de criação de déficits em transações correntes. Além dos lucros pesadíssimos ao mercado, essa política criava vulnerabilidade óbvias, em um momento em que havia sinais de que a crise internacional não refluiria.
No governo, a Fazenda tentava alertar para esses riscos; o BC persistia na visão de que os tempos eram outros e o país teria que se acostumar com o novo patamar de câmbio. E o mercado e Luiz Carlos ganhavam.
Era uma disputa que se resolvia não apenas no nível do governo, mas especialmente da opinião pública. O respaldo à irresponsabilidade do BC vinha do pensamento hegemônico do mercado, dos cabeções.
Aí é que vem a responsabilidade de Luiz Carlos. Ao contrário dos Schwartsmans, Giambiagis, Otávios da vida, Luiz Carlos tem suficiente conhecimento, tarimba e inteligência para entender a economia de forma muito mais sofisticada e realista. Mas, ao mesmo tempo, era gestor de fundos hedge que estavam se esbaldando com o quadro monetário-cambial.
Tome-se o artigo do nosso poliana de 8 de fevereiro, em pleno processo de deterioração das transações correntes e quando o próprio Departamento Econômico do Banco Central alertava para a deterioração das expectativas externas:
(...) Para alguns analistas -entre os quais eu me incluo-, a economia brasileira tem hoje condições estruturais novas e que fazem com que a tempestade nos países mais avançados aqui chegue com ventos bem mais suaves.
(...) A economia brasileira em 2008 vai crescer basicamente por forças internas, principalmente o consumo das famílias e o investimento privado. Já o dinamismo criado pelas exportações está concentrado nos segmentos de commodities agrícolas e de metais. E os mercados futuros desses produtos não mostram sinais de quedas significativas de preços, mesmo no caos que atinge os ativos financeiros.
Como exemplo claro desse descolamento podemos citar o fato de que se espera hoje um aumento de cerca de 50% nos preços do minério de ferro embarcados ao longo de 2008.
Com isso nossas exportações desse produto devem adicionar cerca de US$ 5 bilhões à balança comercial deste ano. Se acreditarmos nas promessas da Petrobras, outros US$ 4 bilhões poderão vir do aumento da produção interna de petróleo.
Esse cenário benigno só poderá ser afetado se a crise externa mudar de maneira importante as expectativas, principalmente do setor empresarial, inclusive o financeiro. E isso só ocorrerá caso tenhamos uma desvalorização importante do real. Mas basta olhar para o mercado de câmbio e notar que nossa moeda -já com seis meses de crise- é hoje uma das mais fortes e estáveis no mundo emergente. (...)
Estamos falando de fevereiro deste ano.
E o artigo de hoje
(...) A volatilidade dos ativos brasileiros, negociados aqui e no exterior, começou a aumentar de forma desordenada. Mas esses sentimentos não chegavam ao lado real da economia, que vivia ainda as doces brisas de um longo verão de crescimento.
A posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajudou muito para preservar esse entusiasmo. Qualificando a crise financeira como uma questão dos países do Primeiro Mundo, ele reforçava a impressão de que as dificuldades enfrentadas eram coisa de ricos. Mas essa cortina de fumaça rósea desapareceu agora em outubro.
(...) Podem estar certos os leitores da Folha que o impacto sobre as empresas e os consumidores vai ser muito duro e duradouro.
Felizmente para todos nós, a cortina de fumaça não paralisou o Banco Central. Enquanto o ministro da Fazenda seguia o tortuoso e perigoso caminho de negar os problemas reais, o Banco Central agiu.
Agiu e quebrou o seu galho e de outros jogadores do mercado. Mas não aliviou em um centavo financiamento ao comércio exterior.
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