"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

terça-feira, setembro 16, 2008

As lições do Ilan

Blog do Luis Nassif - 16/09/08

O artigo do Ilan Goldfajn, no Estadão de hoje, merece ser lido e comentado. Clique aqui.

Crise financeira e excessos

Ilan Goldfajn



(...) Alguns comparam a crise atual com a de 1930. Pode ser ainda exagero. Mas o período é certamente excepcional no sistema financeiro internacional. Quais são as lições da crise?

Ainda é cedo para reflexões completas sobre as lições da crise. Os custos da crise não devem ser cobrados das decisões contemporâneas (por exemplo, salvar ou deixar quebrar), mas das do passado. Faltaram serenidade e limites em várias dimensões nos últimos anos. Os investidores minimizaram o risco das suas aplicações, as agências de classificação corroboraram a idéia de que havia pouco com que se preocupar, os bancos estimularam os excessos vendendo ativos ruins em novas embalagens e novos veículos, os reguladores deixaram esses novos veículos não fazerem parte do balanço dos bancos (e, portanto, requereram menos capital do que o desejado) e os bancos centrais estimularam os excessos com juros baixos por tempo prolongado.

No caso dos EUA (e na Europa também), as lições desta crise servirão para evitar uma próxima, pelo menos nos moldes da atual.

Fantástica conclusão! Uma crise que aparece de cem em cem anos, e Ilan diz que a vantagem é que a crise evitará uma nova crise similar... que aparece a cada cem anos. Se bem que poderá ocorrer outra crise de outra natureza.

Os reguladores deveriam atuar de forma contracíclica, exigindo mais prudência (leia-se capital, provisionamento, etc.) nos momentos de bonança. E nem pensar em deixar veículos de investimento fora dos balanços e da exigência de capital. As agências de classificação poderiam ter menos relevância para a decisão de crédito e avaliação de risco por parte dos bancos. Os bancos centrais também atuariam na contramão dos excessos, elevando os juros quando surgirem o que parecem ser bolhas, ou seja, excessos nos mercados de ativos. Os bancos, por sua vez, deveriam reforçar suas áreas de risco, de alguma forma tornando-as menos suscetíveis a pressões das áreas de investimentos e negócios e os seus modelos menos permeáveis a percepções otimistas quanto aos preços futuros (no auge da euforia, os modelos assumiam riscos de quedas menores).

O Conselheiro Acácio me disse que concorda integralmente.

(...) No Brasil, o momento deveria ser de reflexão. Até quando vai a crise? Qual é o melhor curso de ação?

Alguns analistas estão-se debruçando sobre essas questões. Mas outros - inclusive alguns ministros e ex-ministros, estimulados pelo clima na comemoração dos 200 anos do Ministério da Fazenda - rapidamente preferiram entrar em embates ideológicos ultrapassados. Os resgates nos EUA supostamente teriam demonstrado que o "neoliberalismo" (inimigo de fantoche favorito) e até o capitalismo estariam "enterrados". (...) De qualquer forma, a crítica ideológica dirige-se a um "fantoche": a idéia de que o mercado (e, em última instância, o capitalismo) prescinde de regras, regulação e instituições fortes.

Contra uma crítica ideológica, nada melhor do que uma contra-crítica... ideológica.


(...) A lição verdadeira é despender esforços para identificar e atuar sobre os excessos que ocorrem nos momentos de bonança. Nesse sentido podemos dizer que, se há excessos na economia brasileira, eles deveriam ser, hoje, combatidos de forma a manter a economia crescendo de maneira sustentada e evitar problemas futuros.

Numa dimensão, essa lição já vem sendo adotada. O Banco Central do Brasil (BC), já faz vários meses, identificou no contexto atual um crescimento da demanda (consumo, gastos do governo, investimento) que vai além da capacidade de suprimento da economia, o que coloca riscos inflacionários no sistema.

Sinais claros de deflação no horizonte, de desaquecimento da economia global (e, por tabela, da brasileira), nenhum sinal mais evidente, nos índices de preços, de excesso de demanda pressionando preços. IGP-M caindo, IPC-S caindo.

Para combater esse excesso na economia o BC tem subido os juros de forma a promover uma desaceleração na economia (ainda não aparente). Em outras dimensões, os excessos ainda correm soltos. Os gastos do governo crescem a taxas que não são sustentáveis e que não serão facilmente reversíveis em momentos de dificuldade, em especial as contratações e os aumentos salariais concedidos ao funcionalismo. Outros exemplos existem. O crédito no Brasil cresceu 30% nos últimos 12 meses.

O foco da crise internacional é o trancamento do mercado de crédito. E nenhuma palavra sobre o déficit nas transações correntes que, segundo o próprio Banco Central, seria suprido com crédito e investimento externos.

Em suma, a crise financeira internacional ainda não encontrou seu fim. As lições da crise mostram que é imperioso atuar nos momentos de bonança. Ideologias à parte, é imperioso questionar se estamos fazendo o suficiente para combater os excessos atuais. No Brasil, como foi no exterior, os custos dos excessos só poderão ser medidos e julgados quando o ciclo mudar, certamente não quando a economia cresce 6% e a popularidade está em alta.

Se houver uma crise externa, o Ilan já tem o culpado: o excesso de gastos do governo, o mordomo do filme.

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