Caros leitores, estou de regresso a Moscovo, mas não podia deixar de relatar uma experiência única em Kiev, a que está ligada a caricatura publicada.
O jornalista Savik Schuster, que fez dos melhores programas políticos da televisão russa enquanto na Rússia existia liberdade de expressão e, depois, mudou-se para a Ucrânia, onde pode continuar a fazer o seu trabalho, convidou-me para eu participar no seu talk-show político "Schuster Live", transmitido na sexta-feira à noite no canal televisivo Ukraina.
A Ucrânia tem realmente coisas únicas e uma delas é o grande interesse da população por programas televisivos sobre a vida política do país. O programa citado e outro talk-show no canal televisivo Inter prendem a atenção de 48% dos espectadores. E isto é ainda mais extraordinário se tivermos em conta que o programa da Inter tem uma duração de três horas e o da Ukraina cerca de quatro horas e meia.
Claro que aceitei o convite e não fiquei arrependido. Ao contrário da unanimidade dos canais de televisão russa, claramente imposta pelo Kremlin, na Ucrânia ainda é possível discutir todos os problemas nacionais e internacionais abertamente, embora, por vezes, sem as mais elementares regras de respeito pelos interlocutores.
Savik Schuster reuniu no estúdio cem representantes da opinião pública ucraniana, três embaixadores de países da UE (República Checa, Hungria e Lituânia), numerosos deputados e outras figuras políticas proeminentes da política ucraniana, bem como jornalistas e especialistas. O objectivo era discutir a "guerra do gás" entre a Ucrânia e a Rússia.
Ia-me esquecendo de dizer que a Rússia estava representada por Boris Nemtsov, antigo ministro da Energia de governos do Presidente Ieltsin, e pelo dirigente nacional-palhaço Vladimir Jirinovski (via satélite).
Os diplomatas da UE foram um reflexo bastante real da política, ou melhor, da falta de uma política concertada de Bruxelas no campo da energia, prometendo soluções apenas para o futuro.
Quanto às discussões entre os políticos, é difícil transmitir a verdadeira balbúrdia criada, mas ela está reflectida na caricatura acima publicada, obra do conhecido artista ucraniano Vozniuk. Ficou bem claro que os políticos ucranianos colocam os seus interesses pessoais e políticos acima dos interesses do país. Nem sequer o perigo da falência económica e financeira da Ucrânia os faz enterrar o machado de guerra.
Verdade seja dita, fora dos estúdios, os insultos e acusações dão lugar a beijinhos e abraços. Talvez tenha sido por esta razão que os embaixadores da República Checa e da Hungria ficaram indignados quando eu afirmei que "a competência dos dirigentes da UE parece estar ao mesmo nível da competência dos políticos ucranianos", embora tenha sublinhado que "não pretendo ofender ninguém".
Ainda mais indignados ficaram quando afirmei que a UE ainda não tem um sistema de fornecimento e gás único, não obstante ser do domínio público que a Espanha e Portugal, bem como os países do Báltico não estão ligados aos países da Europa Central e do Sul por gasodutos.
O programa terminou de madrugada, com os convidados praticamente esgotados e sem conclusões, ou melhor, apenas com uma conclusão: a sociedade ucraniana está extremamente dividida e não se prevê que as forças políticas decretem tréguas na guerra entre elas para permitir a solução dos graves problemas do país.
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