Desafiando o Rio-Mar: Mamirauá
Há mais pessoas que desistem do que pessoas que fracassam”. (Henry Ford)
Hiram Reis e Silva (*)
- Sonho transformado em realidade
Depois de mais de 300 palestras realizadas na região sul nos últimos nove anos, em Universidades, Estabelecimentos de Ensino Médio, Cursinhos Pré-vestibulares, Lojas Maçônicas, Associações Comerciais e Organizações Militares, nos quais apresentávamos a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) de Mamirauá como modelo de preservação ambiental, chegou, finalmente, a oportunidade de conhecê-la ‘in loco’.
Graças ao amigo Stiger, conhecemos, no INPA, a pesquisadora Vera Silva, considerada a maior especialista em mamíferos aquáticos amazônicos do mundo. A Vera, na oportunidade, acenou-nos com a possibilidade de que poderíamos conseguir autorização para visitar a reserva através do Instituto Mamirauá. Já havíamos descartado totalmente a hipótese de conhecer a RDS, pois havíamos feito contato através da Pousada Uacari e a diária era impraticável. Os administradores não se sensibilizaram com nosso projeto científico-cultural envolvendo alunos do ensino médio e fundamental.
Já estávamos descendo o Solimões quando a Vera solicitou maiores informações sobre o projeto para encaminhá-las ao Instituto. Seguindo sua orientação, minha querida amiga Rosângela, de Bagé, RS, enviou toda documentação solicitada ao Gerente Operacional do projeto, senhor Josivaldo Modesto, conhecido como César, que se empenhou pessoalmente para que a autorização fosse concedida.
O resultado de todo este processo foi de que desde que entramos na área da reserva fomos abrigados em seus flutuantes, sem qualquer ônus e tratados como pesquisadores que somos. O César, em particular, tem sido incansável em nos apoiar, permitindo nosso acesso a todas as informações que solicitamos.
- RDS – Pequeno histórico
Até a década de 80, o macaco branco de cara vermelha, conhecido como uacari, só havia sido descrito no século XIX pelo naturalista inglês Henry Walter Bates. Em março de 1983, um biólogo paraense chamado José Márcio Ayres parte de Tefé no navio Gaivota, financiado por seu pai, para pesquisar os uacaris. Depois de diversas tentativas frustradas, Ayres aportou o Gaivota na Boca do Mamirauá. Após anos estudando os curiosos primatas, seu estudo foi publicado em 1986 e, em 1990, mais de um milhão de hectares da várzea, incluindo a área onde havia desenvolvido seu estudo, foram declarados pelo governo estadual como Estação Ecológica Mamirauá. Em 1992, foi criada a sociedade civil Mamirauá, com o intuito de coordenar pesquisas e trabalhos de extensão na reserva e, em 1996, a ONG publicou seu plano de manejo, visando o uso sustentável dos recursos naturais e o policiamento dos recantos mais longínquos da reserva. Ato contínuo, o governo estadual consagra estes princípios, criando a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá.
- A Várzea
Em decorrência das inundações periódicas, o rio Solimões, rico em nutrientes, proporciona o habitat ideal para a reprodução e berçário para mais das 300 espécies de peixes da reserva. Por outro lado, o crescimento desordenado dos grandes centros urbanos na Amazônia e a conseqüente busca por proteína barata, tornam a opção pela busca do pescado nos lagos e rios uma ameaça, tanto ao ecossistema de Mamirauá como de todos os outros.
- Pesquisa científica
O governo brasileiro, através do CNPq (Conselho Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e de doadores internacionais, financia projetos como o de estudo ecológico do pirarucu, a rádio-telemetria dos botos e do jacaré-açú, dentre outros, tornando o Mamirauá um centro de excelência para estudos relativos à floresta alagada.
- Extensão
Junto à população ribeirinha são desenvolvidos projetos de saúde, educação ambiental e técnicas agrícolas, com a experimentação de novas técnicas produtivas de árvores frutíferas, planos de manejo madeireiro sustentável e artesanato tradicional envolvendo cerâmica e cestaria, além da operação de uma rádio comunitária.
- Conclusão
Reputamos a RDS Mamirauá como modelo, tendo em vista o envolvimento democrático da população ribeirinha na absorção e aplicação de novas técnicas ambientais, no controle e fiscalização dos recursos naturais da reserva e a modelar ação norteadora do Instituto como organização científica de excelência, apresentando novas alternativas sustentáveis. A corrupção que verificamos em toda a nação, nos órgãos encarregados de fiscalizar os atos lesivos ao patrimônio genético e ambiental do país, mostra ser Mamirauá um modelo que deu certo e que está em constante reformulação e aperfeiçoamento. Nossos reiterados agradecimentos ao amigo César e a todos do Instituto pela cordialidade e carinho com que nos receberam.
(*) Coronel de Engenharia; professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA); membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB); presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS)
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