"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música"
Friedrich Nietzsche

sábado, março 14, 2009

Por que os 'afropessimistas' estão errados

Instituto Humanitas Unisinos - 11/03/09

Em artigo para o jornal La Repubblica, 10-03-2009, o escritor africano Abdourahman A. Waberi diz-se otimista com relação à África. Segundo ele, contrariamente aos que ele denomina de "afropessimistas", "a África não é mais só um alhures, mas sim uma realidade presente no seu interior, uma realidade inevitável com a qual os ocidentais devem aprender a acertar as contas". E conclui: "A África hoje já está aqui, assim como o outro já está em mim". A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o artigo.

Quando penso na África, mesmo sem negar suas muitas dificuldades, procuro ser otimista. Quem reduz o continente africano só à crise e à violência – como muitos "afropessimistas" fazem – é, no fundo, prisioneiro de uma visão típica do Norte do mundo, que olha a África só em termos de redenção ou de derrota. É uma lógica binária e maniqueísta com a qual não posso compartilhar. Deve-se, pelo contrário, procurar analisar a realidade africana na sua complexidade, tendo em conta as suas dinâmicas históricas.

A crise do Darfur, por exemplo, nasce de um complexo de causas passadas e presentes, algumas das quais dependem do contexto internacional. Levando-as em consideração, entende-se melhor por que a opinião pública árabe-africana defende Omar al-Bashir, perguntando-se por que a justiça internacional seja levada adiante só agora, enquanto que em outras ocasiões ela foi totalmente silenciosa e ausente. Bashir não é, certamente, um democrático, e sua política despreza os direitos do homem, mas também não é certamente o único ditador no mundo. E quem o defende ou o condena fá-lo por cálculo. Em todo o caso, além das condenações atuais, seria talvez mais útil defender e ajudar os democráticos sudaneses que há muitos anos contra ele.

O verdadeiro problema é que, na base das crises que sacudiram a África nos últimos anos – da Ruanda à Somália, do Congo ao Darfur – há sempre um enlaçamento de problemas econômicos que nascem da escassez de recursos. Só depois é que a competição econômica assume características políticas, desfrutando uma identidade religiosa ou tribal. É inegável que o grande desequilíbrio entre a África e o Ocidente é fruto do colonialismo e, antes ainda, do tráfico de escravos. Dois fenômenos que empobreceram um continente que até então tinha conhecido o seu desenvolvimento. Deve-se destacar, porém, que, se os africanos depois do colonialismo não conseguiram emancipar-se desse desequilíbrio, é porque, depois de uma primeira década de euforia democrática, as elites no poder não estiveram à altura da situação, dilapidando e depredando as riquezas dos Estados africanos.

Entretanto, não se deve generalizar, dado que há também exemplos positivos. Pense-se em Botswana, em Mali ou nas Ilhas Maurícias, onde, mesmo com milhares de problemas, a evolução foi positiva. Também Ruanda, depois dos anos da tragédia, mostra hoje sinais encorajadores de retomada, com alguns elementos de originalidade. Por exemplo, um parlamento dominado pelas mulheres – consequência indireta do genocídio que atingiu sobretudo os homens – que influencia positivamente no desenvolvimento de uma sociedade anteriormente muito tradicionalista.

Um outro elemento encorajador é a crescente difusão da cultura africana no mundo ocidental. A vitalidade cultural do continente, exceto pelas importantes quedas econômicas (em Mali, a economia ligada à música tem um peso agora como a economia do algodão), demonstra que, quando as condições de princípio são as mesmas que em outros lugares (para a cultura, não há necessidade de grandes infraestruturas), os africanos competem sem dificuldade com o resto do mundo.

Infelizmente, o Ocidente se lembra da África só nos momentos de crise. Se se ocupasse dela mais frequentemente, seguindo sua evolução em sua duração, seria menos surpreendido pelos acontecimentos mais trágicos. E, sobretudo, se daria conta de que a África não é mais só um alhures, mas sim uma realidade presente no seu interior, uma realidade inevitável com a qual os ocidentais devem aprender a acertar as contas. A África hoje já está aqui, assim como o outro já está em mim.

Nenhum comentário: